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sábado, 3 de janeiro de 2009

ADORADOR DO DIABO FRACASSADO


Foto de alguns dos meus ex-amigos satanistas dando-me boas vindas. Saudades. Galera gente boa!


Dezessete pra dezoito anos. Auge da crise na adolescência ( meio tardia até). Busca de identidade e principalmente de respeito. Respeito se conquistava pelo medo, eu pensava. E medo se provocava pelo avesso. Algo que, contrário às normas, fizesse com que as pessoas se afastassem. Nazismo estava fora de questão, já que meses antes eu já experimentara uma situação de fracasso dessa área ( ver NEO-NAZISTA FRACASSADO). Avesso ao convencional, à família, à pátria, à religião. Isso mesmo: à religião! Ia me tornar um adorador de satã! Mas adoradores de satã não saem na rua fazendo passeatas, reivindicando os seus direitos. Como eu ia entrar em contato com essa galera do mal ? Comprei alguns livros e achei uma babaquice danada. Mas o que eu queria, não era me converter, até porque eu achava esse lance de satanismo uma palhaçada do cacete, mas eu precisava andar no meio dessa galera pra que todos, sabendo disso, respeitassem o novo satanista da praça. Na época não existia Internet, portanto não seria fácil como hoje descobrir células ou núcleos de adeptos dessa assustadora (anti) religião. Procurei em jornais e revistas, até que um amigo meu roqueiro ( daqueles metaleiros da pesada) me batera o lance: havia um grupo de deathbangers na região que curtia esse lance que eu queria conhecer. Deathbangers ? Que merda é essa? Perguntei, no alto da minha ignorância musical. Deathbangers, o camarada me explicou, são uma subcategoria do rock pauleira que ouvia bandas que pregavam o satanismo e o anti-cristianismo. Veneravam ( os tais deathbangers) principalmente bandas gringas.

Comecei a pesquisar sobre o lance. Vi que existia uma indumentária própria dos deathbangers: calça de couro e camisa preta com o nome da banda favorita, coturno, cabelo grande e bracelete couro e pregos. Bracelete couro e pregos? Pra quê essa merda? Pensei cá com os botões da minha camisa pólo ( até então, o único tipo de uniforme que eu usava). Mandei ver. Fui ao Rio de Janeiro numa loja especializada, comprei o uniforme completo ( inclusive com bracelete de couro e pregos) e uma peruca preta de longas madeixas lisas.

Perguntei pro tal camarada meu, onde os satanistas se encontravam.

- No cemitério – ele disse.

Porra, cemitério? Que merda! Será que não havia, pelo menos, encontros esporádicos no Mc Donalds ou no Bob’s ?

- Não! – respondeu metaleiramente lacônico o brother.

E continuou:

- Mas se você quiser encontrar todos, inclusive os cabeças da gangue, eles se encontram numa loja de discos na cidade vizinha. Amanhã abre.

Podicrê.

No dia seguinte, meti minha fantasia ( digo, “visual”) , bandana pra prender bem a peruca e, antes de sair de casa, tava tendo um churrasco no quintal, todos os meus tios e primos todos caindo na gargalhada e olhando pra mim. Começaram a me chamar de gótico. Era 1992, e tava passando uma novela na Globo chamada De corpo e alma que tinha uma gangue de góticos. Eu putão tentando explicar que gótico era coisa de boiola depressivo e que eu era satanista sinistrão, mas neguinho não me ouvia. Ficavam gritando “Reginaldo”, “Reginaldo”, que era a porra de um personagem vivido pelo ator Eri Johnson que era essa merda na novela, e riam pra caralho.

- U-U-A... – era o barulho que fazia quando o personagem Reginaldo entrava em cena e eles, aos berros gritavam pra mim.... U-U-A...

- Vai tomar no cu!

Sai puto da vida. Calor do caralho, todo mundo de sunga e short sem camisa na rua e eu todo de preto, peruca e bandana de caveira e o tal bracelete de couro e pregos que comichava pra caralho.

Peguei o ônibus e cheguei na tal loja. Todo mundo de calça de couro preta, camisa preta, coturno e bracelete de couro e pregos. Eu, ali, tava em casa.

- Yeaahh! -sinalizei berrando ao entrar na loja e fazendo com as mãos o metaleiro sinal dos chifrinhos, levantando o indicador e o mindinho. Silêncio. Todos me regularam. Fiquei esperando.

- Yeaahh! -todos responderam.

Respirei aliviado e comecei a me enturmar. Papo satanista vai, papo satanista vem
e percebi que, no meio da galera da loja, tinha um cara que parecia ser o mais respeitado.

- Quem é esse cara? – perguntei pro cara de calça de couro preta, camisa preta, coturno e bracelete de couro e pregos que tava do meu lado.

- Ele é o Black Mass, o cara mais sinistro da galera. Ele é quem consegue as fitas cassetes da bandas mais power-violentas gringas. Só parada desconhecida. O cara é foda! Tem até uma estátua tamanho natural do Satã no meio da sala dele!

[ Lembre-se que nessa época, meados de 1992, não existia esse lance de baixar facilmente músicas na Internet. Na verdade nem existia Internet e muito menos CD. Era só vinil. E os vinis importados eram caríssimos. Sobretudo os de deathbangers.]

Comecei a olhar na prateleira da loja e vi nos vinis cada nome mais estranho do que o outro: Mantas, Celtic Frost, Morbid Angel, Cannibal Corpse, Marduk, Emperor, Gorgoroth, Dimmu Borgir, Cradle of Filth, Immortal, Dark Funeral, Darkthrone Death, Obituary, Deicide, Cryptopsy, Nile, Benediction.

Cada nome besta ( nem só o número era da besta – ri sozinho do trocadilho! ). E tudo caro pra caceta. No som da loja um som barulhento pra cacete, parecendo um motor de trator. Um som embolado com uns grunhidos ininteligíveis.

Peguei um dos vinis, de uma banda chamada Deicide e perguntei pra outro camarada cara de calça de couro preta, camisa preta, coturno e bracelete de couro e pregos:

- Que banda é essa? É pauleira?

- Qual é cara? Cê tá de sacanagem! Deicide é uma banda de death metal dos States, formada em 87. A palavra "deicide" significa "O ato de matar um ser de natureza divina; particularmente cruxificarJesus Cristo". A palavra pode significar também "Aquele que tem interesse em matar Cristo". Dizem, inclusive, que o vocalista, Glen Benton, tocou fogo em várias igrejas.

Fiquei bolado.

Continuei perguntando:

- Mas essa banda é a clássica banda de Death Metal? Satanistona mesmo?

- Cara, o death metal é um estilo musical extremo que aborda desde satanismo, guerras e até assassinatos,suicídios e carnificinas.O death metal tem muitas outras vertentes dentro de si, como thrash death metal, tech death metal, splatter death metal, death metal melódico, brutal death metal entre outras. O som é caracterizado por riffs pesados e distorcidos e por vocais guturais. Mas c~e você tá querendo paradas satanistas, é melhor cê curtir Black Metal que á é a vertente mais extrema e obscura dentro do heavy metal. O Black surgiu no começo da dácada passada com bandas como Venom e Mercyful Fate. O som, nesse caso, é caracterizado por letras satanicas, por vocais rasgados e riffs de guitarra rápidos e pesados.

Minha cabeça latejava. Calor pra caralho, somado ao excesso de informações que o camarada disparava e a bandana na peruca que tava apertando pra cacete. Bracelete penicando. Saí da loja, mas não sem antes disparar o Yeaahh!

- Yeaahh! – meus novos amigos responderam carinhosamente.

Cheguei em casa e ainda tava rolando o churrasco. Samba do Dicró no talo do toca fitas. Neguinho bebaço olhando pra mim:

- U-U-A... Reginaldoooooo! U-U-A... Reginaldooooo!

Sai direto pro meu quarto pra tirar aquela porra daquela roupa calourenta pra caralho.

Minha mãe triste veio na minha direção.

- Meu filho, sabe porque tá havendo esse churrasco hoje? Hoje é o seu aniversário! E você nessas roupas de gótico saiu disparado e nem deu tempo de você abraçar a sua avó e as suas tias que já foram embora. Deixaram uns presentinhos aqui pra você.

Eu nem tinha me ligado, distraidão, esquecera do próprio aniversário. Uma sexta-feira 13. Raros os meus aniversários que caiam na sexta-feira. Senti que era predestinação, eu tinha que ser satanista mesmo. Duvido que meus tios cachaceiros não iam me respeitar, pensei.

- Aqui meu filhinho, seu presente que eu comprei que cê tanto queria. É de segunda mão, mas tá inteirinho.

Era um gravador cassete portátil c/ pausa Aiko Atm 709, com toca-fitas e gravador de som ambiente. Meus olhos marejaram d’água.

-Brigadão mãezinha! Beijo! Beijo! Beijo!

Corri feliz da vida pro quarto e coloquei dentro uma fita do RPM que eu curtia pra caramba. Apertei o botão e saí pra tomar banho. Só que, sem perceber, eu acionara o botão de gravação do som ambiente. Quando eu voltei do banheiro, estranhando que não havia começado a tocar, verifiquei a fita e vi que ela já tinha passado um lado todo. Voltei a fita, e ao ouvi-la, vi que tinha apagado um lado inteiro da minha fitinha de estimação do RPM gravando a porra do Dicró que tava rolando no churrasco. Só que, como o toca-fitas era de segunda mão e o gravador provavelmente estava desregulado, o som que saía das fitas era um som torto, grave, sinistro, com uns berros infernais ao fundo. Porra, que berros eram aqueles? Descobri.Era dos meus priminhos encapetados esgoelando no corredor brincando de pique e fazendo bagunça.

“Encapetados?” – pensei.

Putaquepariu! Já sei o que eu vou fazer!

Peguei umas revistas de ciências que eu tinha, recortei uns desenhos de uns ossos e colei num papelzinho de forma que fizesse uma cruz de cabeça pra baixo. O símbolo do anti-cristianismo. Do satanismo mais sinistro. Escrevi de canetinha em cima da tal cruz “Profanity” e corri pro centro da cidade pra tirar uma xerox da minha colagem.

De volta em casa, preparei a capinha, coloquei a fita dentro e me sentido um Rambo em busca de uma ação, coloquei cheio de orgulho minha camiseta preta, meu coturno, minha peruca com bandana de caveira e o tal bracelete de couro e pregos. Parti pra loja novamente. Era, já, quase seis da tarde quando eu entrei na loja. Estava lotada. Dessa vez, com um ar meio blasé, metidão, dirigi-me ao dono da loja e falei:

- Bota esse som pra rolar aí mermão!

O cara pegou a caixinha, olhou o desenho da capa intrigado e tirando a fita de dentro, taca logo direto no toca-fitas Pionner da loja.

Um estrondo nas caixas de som chama a atenção de todos que se voltam pra minha diração. Uma barulheira infernal começa a tomar conta da loja. Todos pasmos começam a se aproximar.

- Ca-ra-lho! Que som é esse cara? Nunca ouvi uma palhetada de guitarra tão rápida. Esses berros parecem estar saindo diretamente do inferno! – disse-me um cara de calça de couro preta, camisa preta, coturno e bracelete de couro e pregos.

No meio da aglomeração, todos abrem um espaço pra alguém que abrindo caminho vem pro meu lado. Era o Black Mass. Tremi.

- Que som é esse aí, velho? Nunca ouvi isso!

- É-é d-de u-uma banda inglesa de black-death-power-satanic-metal que eu trouxe da última viagem que eu fiz pra Inglaterra. Chama-se Profanity. Eu soube que o vocalista, John Black Cataplasm, já estuprou metade das freiras de um convento, tacou fogo no portão principal do Vaticano e fez sopa de letrinhas com a Bíblia.

Black Mass se afasta e dá as costas pra mim raivosamente.

Todos os satanistas da loja ouvindo minha história, vêm em minha direção me abraçar. Levantam-me no alto e lá de cima vi o Black Mass encostado na parede de cabeça baixa . Eu era o novo rei do pedaço. O novo chefe dos satanistas! Todo mundo ia me respeitar! Inclusive os meus tios pagodeiros.

As lágrimas corriam dos meus olhos de satanista, até que, de repente, começa a tocar nas caixas de som da loja:

Sinais de vida no país vizinho

Eu já não ando mais sozinho

Toca o telefone, Chega um telegrama enfim

Ouvimos qualquer coisa de Brasília

Rumores falam em guerrilha

Foto no jornal, Cadeia nacional

- Que porra é essa mermão?

Colocam-me violentamente no chão. Vários caras de calça de couro preta, camisa preta, coturno e bracelete de couro e pregos me cercando. Nesse momento eu descobri a função do tal bracelete de pregos.

- RPM... falei gagejando.

Continuei a cantar pra tentar descontrair.

“Viola o canto ingênuo do caboclo

Caiu o santo do pau ôco

Foge pro riacho, Foge que eu te acho sim

Fulano se atirou da ponte aérea

Não agüentou fila de espera

Apertar os cintos, Preparar pra descolar"

Eu, vendo que o tempo ia fechar, e que eles sacaram que tinham sido tapeados, que a fita não era da Inglaterra porra nenhuma, saí em disparada de dentro da loja.

Olhei pra trás. Black Mass praguejava à todos os demônios. Dizendo que faria um vodú meu. Que iam me matar.



De longe eu ainda escutava:


Nos chegam gritos da Ilha do Norte

Ensaios pra Dança da Morte

Tem disco pirata, Tem vídeo cassete até

Agora a China bebe Coca-Cola

Aqui na esquina cheiram cola

Bio degradante Aromatizante tem

Um comentário:

o dr. A. Noel disse...

Verídico! E Black Mass me deve até hoje um bootleg duplo do Slayer, que ganhei honestamente numa aposta em Valença.