fracassos

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sexta-feira, 13 de março de 2009

ROTEIRISTA DE FILME AUTOBIOGRÁFICO FRACASSADO

Hoje é sexta-feira treze de março de 2009. Sorte minha que eu não sou supersticioso: nasci numa sexta-feira treze, às treze horas e treze minutos.




[ minha certidão comprovando a data e a hora azarada, pros incrédulos confirmarem]



Segue abaixo o roteiro que eu fiz para um filme autobiográfico, desde o nascimento até os meus 33 anos ( idade em que eu tinha certeza que ia morrer), mas...

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Voz em off dizendo:

-Acho que até antes de eu nascer, o azar já me perseguia.


Cena - Anos 70, casal se paquerando em uma discoteque, visual típico da época.

Aproximam-se, o homem diz:

- Que sorte te encontrar aqui, sempre te vejo na escola...

Beijam-se.

Cena de começo de namoro.

A mulher diz que está grávida.

- Pó, que azar! Diz o homem.

Continua voz em off: ( enquanto passa imagens de bebê no útero)

Mas nunca acreditei nesse lance de azar ou sorte, nunca fui superticioso.

Homem em carro desesperado. Trânsito engarrafado. Mulher resfolegando. Pneu fura em plena favela.

( outras situações azaradas, provocando suspense...)

Corta para cena em hospital. Mulher em trabalho de parto. A câmera focaliza um calendário eletrônico, daqueles antigos, marcando sexta-feira 13, 13:00.1975.

A mulher em desespero, resfolegando, gritando de dor. O médico, com dificuldade para retirar a criança comenta:

- Você não está com muita sorte minha filha, a cabeça dessa criança é enorme!

Até que , demonstrando alívio, consegue tirar a criança e ela chora.

Câmera focaliza novamente o relógio: sexta-feira 13, 13:13. 1975.

Voz em off:

Nasci, na sexta-feira 13 às 13 horas e treze minutos.

Cena de ambulatório infantil, criança na incubadora, família inteira em volta preocupada. Comenta o médico:

- É desidratação.

Chama o pai num canto e comenta:

- Se tiver muita sorte ele sobreviverá, mas talvez com seqüelas.

Cenas de evangélicos e critãos, rezadeiras e até de pais de santo rezando em volta da incubadora da criança.

Câmera mostra incubadora com pé de coelho e ferradura.

Comenta um senhor , pro desagrado de todos diante de sua inconveniência, em voz alta:

- Que moleque feio einh! Se tiver sorte, quando crescer vai poder trabalhar em trem fantasma.

Voz em off:

Sobrevivi,e desde criança mantive uma convicção: não acreditava e odiava essa historia de sorte e azar.


Corta pra cenas de infância. Moleque franzino com óculos fundo-de-garrafa.

Não sendo escolhido no futebol. Tomando porrada de moleques maiores.

Era feio, assumo, mas me orgulhava do cabelo preto, liso, brilhoso. Não cortava de maneira nenhuma.

Cena das menininhas da escola alisando-o e elogiando-o. Os moleques, de longe, com inveja, mas comentam em tom jocoso a aparência ridícula do garoto. Desdenhando de sua aparência.

Cenas mostra todos os garotos imaginando, com cabelos como o dele sendo afagados pelas meninas.

- Pô, o cara tem sorte mesmo, nascer com um cabelo bacana desse.

Até que um dia, Selminha, a mais bonitinha da sala , com a sua cabeça deitada do colo , fazendo-lhe cafuné, grita:

- Lêndea!

Câmera filma de cima . Pega o pátio inteiro da escola. A molecada e a meninada olhando todos ao mesmo tempo pra nós.

- Lêndea! Sua cabeça ta infestada de ovinhos de piolho ! Ai que nojo!!!

Afasta-se chorando, esfregando as mãos, enquanto a molecada vai se aproximando, sacaneando:

- Piolhento ! Piolhento! Piolhento ! Piolhento! Piolhento ! Piolhento!

Cena do menino em casa, a mãe olhando minunciosamente a dando-lhe uma notícia estarrecedora :

- Vai ter que raspar!

Voz em off:

Pesadelo! Minha única virtude era ter os cabelos sedosos e lindos e agora teria que raspar.

Mostra imagem do garoto careca, com óculos fundo-de-garrafa, roupa ridícula, sozinho num canto.

- Não! Não vou raspar de jeito nenhum!

- Não tem jeito meu filho, Não há remédio no mundo que consiga matar todas essas lêndeas. Ta infestado!

O garoto sai correndo e vai pro quarto chorando.

Enquanto isso, em off:

Eu tinha que dar um jeito naquilo. Eu era uma espécie de sansão, sem os meus cabelos eu perderia meu poder de sedução.

Corta pra cena do garoto ouvindo a conversa na sala entre sua mãe e uma amiga.

Diz a mãe:

- Não sei o que eu faço com o meu filho! Tem mais de uma semana que ele não quer ir pra aula e ainda por cima recusa-se a raspar a cabeça.

- Criança é assim mesmo, a gente dá o maior carinho e eles acabam tornando-se uns tremendos mal-criados, diz a amiga.

- Mas menina, mudando de assunto, o que você conta de novo?

- Ah querida, vim aqui só pra te contar uma maravilhosa que eu descobri: sabe aqueles desagradáveis fios brancos que aparecem na nossa cabeça? É balzaquiana, descobri uma tintura pro cabelo ma-ra-vi-lho-sa que encobre todos, Olha aqui, [abaixa a cabeça] consegui achar um perfeitamente da cor original dos meus cabelos. E nem parece que foi pintado! Vende lá da farmácia do seu Alfredo!

- É mesmo menina, seu cabelo tá lindo, igual quando você tinha 10 anos...

Voz em off:

Fiquei maravilhado com a descoberta, havia descoberto a solução para o meu problema. Ia pintar todos os fios meu sedoso cabelo de preto e com isso, as desgraçadas lêndeas também.

Cena do garoto na farmácia escolhendo tinturas e feliz lê numa caixa: “ Para cabelos pretos, macios e sedosos”.

Corta pra cena do garoto , em casa, pintando escondido o cabelo.

- Mãe, olha só, as lêndeas sumiram ! Nem vou precisar de raspar a cabeça!

A mãe examinando, surpresa, e comentando:

- É mesmo meu filho que dádiva! Agora você pode voltar pra escola que já deve estar atrasado na matéria! Vou até lá fora comprar um uniforme novo pra você, novinho, branquinho ! Que maravilha!

Corta pra cena do garoto entrando na escola. Slow motion, cabelão preto voando, reluzente, uniforme engomadinho. Cara de orgulhoso. Todos olhando. Chega para a Selminha que está de costas e , antes que ela diga alguma coisa, exclama:

- Acabaram as lêndeas, podem olhar [ abaixando a cabeça no meio da rodinha de meninas] !

As meninas examinam e com ar de apaixonadas confirmam. Os garotos, de longe, com cara de raivosos ficam resmungando. Selminha ainda diz:

- Seu cabelo parece que ficou mais bonito ainda, e mais macio...

Cena mostra - em slow motion – bem de perto Selminha passando os dedos por entre os seu fios de cabelo. Câmera enquadra de perto a cara de apaixonada de Selminha, a das meninas, a dos garotos e a dele, com cara de orgulhoso. Até que, quando seus dedos terminam de transpassar todo o cabelo, ela olha para as costas da mão assustada e berra;

- O que que é isso ? Esse monte de bolinhas pretas na minha mão?

Voz em off:

O que eu não sabia, ao pintar o cabelo de preto, era que a química da tintura faria com que as lêndeas soltassem-se tão facilmente.

Cena mostra em slow motion o garoto olhando com cara de desespero para os ombros da camisa branquinha, lotados de bolinhas pretas e olhando novamente para o rosto da Selminha, agora com ar apavorado:

- Lêndea preta?
E desmaia.

Os garotos começam a gritar: Aberração ! Lêndea preta! Lêndea preta! Lêndea preta!

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Corte abrupto para o garoto sentado numa aula de catecismo, aquele tom monocórdido, ele desenhando Jesus enquanto, de repente acorda e ouve a professora dizendo:

- Pois o Nosso senhor Jesus Cristo foi-se aos 33 anos e com isso deixou, através de seus milagres, do que fez e quem foi, vários ensinamentos que mudaram a história da humanidade.

Cena mostra o garoto olhando para o desenho de Jesus no caderno e escreve embaixo do desenho:

Estou com 13 anos e sou um fracasso total. Será que até os 33 anos eu conseguirei fazer alguma coisa que preste?

Cena do garoto andando com o caderno nas mãos, desolado, pela calçada, quando, repentinamente, uma cigana de aparência desleixada, dentes podres, cabelos desgrenhados , toma-lhe a mão direita , à força, ele tentando desvencilhar-se, gritando:

- Larga a minha mão, velha desgraçada ! Não acredito nessas superstições !

Ela, ainda segurando com muita força, consegue virar a palma da mão direita do garoto para cima e ao olhar, faz cara de incrédula, chega o rosto mais perto da palma da mão para conferir e fazendo uma expressão extremamente assustada exclama:

- Menino ! A sua linha da vida é muito curta! Aqui diz que você não vai passar dos 30, deixa eu ver direito

E chega o rosto mais perto da palma da mão do garoto, quase encostando no rosto.

O garoto sacudindo-se com força, tentando tirar a mão, sem sucesso.

- 33 anos ! Aqui diz que você não passa dos 33 anos !

O garoto dá um solavanco e consegue tirar a mão.

- Vai tomar no cu ! Velha desgraçada ! Filha da puta!

E sai aos tropeços, andando rápido.


O menino, ainda andando rápido, olha de soslaio para dentro de um botequim e vê na parede um calendário:

SEXTA-FEIRA, 13 DE MAIO DE 1988.


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Pulo no tempo
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Cena dele já acima dos 30 anos, barrigudo, barbudo, de cuecas, deitado na cama lendo. O quarto com aparência de sujo. Livros jogados para todo o canto, vinis, cinzeiros sujos. A câmera volta para ele deitado e mostra nas suas mãos o livro Sexus de Henri Miller.

Voz em off narrando o livro:

“ (...) uma vida totalmente nova estendia-se diante de mim, tivesse eu apenas a coragem de tudo arriscar. Na verdade não havia nada a arriscar: eu estava no primeiro degrau da escada, um fracasso em todo sentido da palavra. Estava me aproximando do trigésimo terceiro aniversário, a idade de Cristo crucificado (...)”


Interrompe a leitura no meio. Abaixa o livro no colo. Senta na cama com cara de espanto. Levanta-se da cama rapidamente, abre o guarda roupa, caem vários livros, folhas, gibis, cadernos. Ele começa a olhar a capa dos cadernos desesperado, até que acha o que estava procurando. Folheia com violência e para numa página específica e fica estático olhando.

A câmera mostra o caderno encardido com um desenho de Jesus e um manuscrito embaixo : Estou com 13 anos e sou um fracasso total. Será que até os 33 anos eu conseguirei fazer alguma coisa que preste?

Levanta-se, ainda segurando o caderno, olha para cima , na parede ao alto do seu ombro esquerdo.

A câmera mostra um calendário:

SEXTA-FEIRA, 13 DE JUNHO DE 2008.

Ele olha pro caderno de novo. Sacode a cabeça e de repente lhe vem a lembrança [ mostra a cena, turva em eco] da cigana agarrando-o aos 13 anos:

- 33 anos ! Aqui diz que você não passa dos 33 anos !


Ele grita:

- Porra ! Hoje é o meu aniversário de 33 anos !

Olha no relógio, são 13:00. Fica desnorteado. Sai correndo do quarto, de cueca branca, cabelão, barba grande. Desce as escadas desesperado. Vai em direção à rua. Está chovendo muito. Ele para no meio do asfalto, abre os braços, uma luz forte o clareia todo.

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