Quem tem, como eu, trinta anos, ou mais, lembra –se _ por favor, sem saudosismo chato !_ de uma música dos titãs que tocava nos anos 80 chamada “32 dentes” e que dizia ; “...Não confio em ninguém com mais de 30 / Não confio em ninguém com 32 dentes...”..
Saudosismo chato a que eu me refiro é o dos indivíduos de 30 anos ( ao que parece ser essa a idade do marco zero do saudosismo chato) que vivem dizendo :“os bons tempos eram aqueles”. Enquadro em saudosistas chatos aquelas pessoas que enviam os cansativos e batidos e-mails relembrando a década de oitenta, setenta ou noventa, vivem fazendo listas dos 100 maiores de alguma coisa e as publicando em jornais, seja discutindo futebol na TV ou em bares. Ou ainda, assinando colunas de opinião em revistas de todos os tipos. Quem achar que estou mentindo, que atire o primeiro elepê do Legião Urbana! “Não confie em ninguém com mais de trinta anos” diz o dito popular.
Mas porque será exatamente nessa idade que se é atribuída essa característica? É a idade da perda da inocência? Porque trinta? Trinta é o número:- Trinta anos de Imunologia. Trinta anos esta noite. Se vira nos trinta. Motor 3.0 Turbo. Trinta tinha a mulher de Balzac. Você só tem trinta minutos para decidir a sua vida. A vida começa aos trinta.... Na contracultura dos anos 60 (ou pelo menos no final deles), ter trinta anos era uma espécie de data-limite para pactuar com o sistema. E o pior: era compulsória! Se você tivesse mais de trinta, estava frito! Já teria sido assimilado pelo bafo quente da moral e dos bons costumes e não restaria nada a fazer, porém, hoje, em tempos pós-modernos, em discussões politicamente incorretas, ou não, a idéia de moral subverteu-se onde o certo tornou-se errado e vice-versa. Um exemplo disso é que plágio também virou arte, onde o pastiche, a cópia não autorizada tornou-se banal, a informação disponibilizou-se por todos e para todos, pela internet. Esses agravantes ( ter os “inconfiáveis” trinta anos, e ser contemporâneo desse mundo de mentiras) fazem-me justificar o título dessa crônica, para que eu possa provar que você, leitor, deveria ter confiado em mim quando eu disse para que não confiasse em mim. Por exemplo; para construir esse texto, vali-me do mais torpe dos crimes intelectuais: fui no Google ( o oráculo onisciente da pós-modernidade ! ) e, e escrevi palavras-chave, do tipo “Não confie em mim”, “o homem aos trinta anos”, copiei-os, recortei de forma que não pudesse ser percebida essa artimanha, para que eu conseguisse plagiar exatamente 30 textos e colá-los nessa crônica, escancaradamente. Outra coisa, após ter terminado de escrever essa crônica, submeti-a a apreciação e avaliação de um amigo meu, para que fizesse as necessárias correções. Ele encontrou vários erros grotescos. Erros de cálculos de porcentagem [calculos que você verá em breve, arrumados lógico!] Erros também na forma e no conteúdo (ou seja, em tudo !!) , arrumando-os. Acrescentou o que era necessário e suprimiu o desnecessário. Portanto, se há algum mérito qualitativo nessa crônica, definitivamente não é meu.
Quer dizer: Esse meu texto, nem meu é!Viu só? Não confie em mim, sou mentiroso, e quem me conhece sabe que eu não estou mentindo. Sou extremamente exagerado. Em tudo o que digo há uma gigantesca carga de exagero.
Sou patologicamente exagerado, doentio ! (...) Peraí ! Nem tanto! Acho que exagerei um pouco!
Eu até, de acordo com minhas estatísticas, cheguei a uma conclusão exata e numérica do meu grau de exagero: aumento qualquer coisa que vá contar em exatos 67% . Sério mesmo ! Consegui, por mais incrível e inacreditável que possa parecer, mensurar em números essa minha compulsão: 67 % . Por exemplo; se fiquei preso em uma fila de banco e encontro logo depois de sair da fila com alguém conhecido, pra desabafar, conto o ocorrido da seguinte maneira:- _ Caramba rapá ! A fila tava enorme! Devia ter no mínimos umas 100 pessoas. Fiquei umas 2 horas agarrado naquela merda de fila quilométrica!Porém, partindo do pressuposto que são 67% de exagero, se você quiser saber exatamente o tamanho da fila que eu fiquei e o tempo gasto nela, é só calcular usando a tabelinha :
FATO NARRADO >> Quantidade de pessoas na fila = “...no minimo umas 100 pessoas...”> Tempo gasto na fila = “...fiquei umas 2 horas..”CÁLCULO APROXIMADO DO EXAGERO >> 60 (+ 67%) = 100,2 > 2 horas - 1 hora e 24 minutosREALIDADE >> 60 pessoas.> 36 minutosCONCLUSÃO DO PERCENTUAL DE EXAGERO >> ( 67 %)
Entendeu o macete? Então, quando for conversar comigo, precavenha-se. Ande com uma calculadora e faça imediatamente, após o relato, as contas . Assim você não se decepcionará com nada que, depois de comprovado, eu tenha dito (e exagerado).Mas... peraí ! Raciocine comigo: se a minha compulsão por exagerar é democraticamente abrangedora de todos os assuntos dos quais eu me proponha a relatar, e, se eu cheguei a conclusão de que são 67% que eu exagero em todos os assuntos, então nesse relato que eu acabei de fazer também há um exagero! Não concorda?! Então, na verdade, tenho que usar a a fórmula comigo mesmo pra saber realmente qual é o meu percentual de exagero. Tenho que usar a fórmula na fórmula ! Então, se eu subtrair os 67% ( de exagero) dos 67% ( que eu exagerei) que eu disse que exagerava então :
-Fato narrado - Exagero exagerado – (“...eu exagero 67%...” ) >> Percentual de exagero ( 67 %)
Há, porém, um porém : acrescentando o fato de que estamos diante de um silogismo do círculo vicioso, já que sou sempre exagerado, até nessa aferição matemática em busca do percentual exato de exagero, há um exagero embutido. Ou seja, um comportamento neurótico que me levaria a ajustes constantes, inviabilizando a apuração matemática/exata desse fenômeno. Uma vez que algumas contradições são impossíveis de serem superadas, não havendo a menor possibilidade de síntese... Será que essa seria a prova de que não existe a tal da dialética?
Responda-me, por favor . Mas, sem exagero.
terça-feira, 31 de março de 2009
segunda-feira, 30 de março de 2009
COLECIONADOR FRACASSADO
Sem um puto no bolso, estou vendendo toda a minha coleção de quadrinhos, revistas, livros, cd's,vinis e o escambau.
Dvd's, eu faço cópias com capinha colorida e tudo.
Bagatela.
Minha maior preocupação em desfazer-me de tudo isso - que levei décadas pra juntar - era que eu ia privar o meu filho de receber toda essa herança intelectual.
Aí eu me lembrei de que não havia nada de intelectual naquilo tudo, e me lembrei também que nem filho eu tenho.
Criei um blog para listar a tranqueirada toda.
Ainda estou catalogando e digitando mas já tem alguma coisa lá.
www.merdalternativa.blogspot.com
Dvd's, eu faço cópias com capinha colorida e tudo.
Bagatela.
Minha maior preocupação em desfazer-me de tudo isso - que levei décadas pra juntar - era que eu ia privar o meu filho de receber toda essa herança intelectual.
Aí eu me lembrei de que não havia nada de intelectual naquilo tudo, e me lembrei também que nem filho eu tenho.
Criei um blog para listar a tranqueirada toda.
Ainda estou catalogando e digitando mas já tem alguma coisa lá.
www.merdalternativa.blogspot.com
sábado, 28 de março de 2009
ATOR / DIRETOR DE CURTA FRACASSADO
Curta feito em 1998,99, sei lá.
Atuei( o personagem Pé-de-sebo), dirigi, roteirizei e editei.
A Petrobrás, infelizmente, não quis bancar o lindo projeto.
Não preciso explicar esse fracasso, as imagens falam por si.
Vê lá no you tube:
http://www.youtube.com/watch?v=9AjyM9M0gKI
Atuei( o personagem Pé-de-sebo), dirigi, roteirizei e editei.
A Petrobrás, infelizmente, não quis bancar o lindo projeto.
Não preciso explicar esse fracasso, as imagens falam por si.
Vê lá no you tube:
http://www.youtube.com/watch?v=9AjyM9M0gKI
terça-feira, 24 de março de 2009
TWITTEIRO FRACASSADO
Comprei a revista "Época" da semana passada. A matéria de capa era sobre um tal de "Twitter",a nova sensação da internet. Li a matéria inteira umas três vezes e não entendi direito do que se trata com certeza. Entendi, mais ou menos, que é um site em que as pessoas se cadastram com o propósito de responder ou ler a pergunta básica: "O que você está fazendo nesse momento?". É uma mistura de blog e celular. Em vez de seguir para apenas uma pessoa, como no celular ou no MSN, a mensagem do Twitter vai para todos os "seguidores". Aí o Twitteiro vai lá e expõe - dá pra twittar do celular, na meio da rua - seu dia-a-dia( minuto a minuto se quiser): o que está comendo,se está cagando, se brigou com o cônjuge, etc... Superexposição e superconexão a serviço do voyerismo internético.
E os cadastrados recebem as mensagens do seu ídolo( limitadas em até 140 toques) nos seus celulares, orkut, e-mail, etc, em tempo real. Acho que é mais ou menos disso que se trata.
O jogador de basquete shaquile O'Neal posta mensagens o tempo todo. Britney Spears tem milhares de seguidores. O Dalai-Lama pode ser lido no twitter e o brasileiro Paulo Coelho também. O Barack Obama tem 409 mil seguidores. O humorista brasileiro Marcelo Tas ( do CQC) fechou um acordo milionário com a Telefonica para meter o nome da operadora no meio das suas pensatas e informes sobre sua rotina diária, que é seguida por dezenas de milhares de pessoas.
Ao seguir a vida das pessoas famosas, as pessoas normais sentem fazer parte da vida e do cotidiano delas.
Como o Merda Fracassado é um cara antenado e não quer perder o bonde da história ( porra, esse termo acho que já caiu em desuso...) tentei me cadastrar no twitter também. Não tenho certeza se consegui concluir o cadastro. Tá tudo em inglês e eu não entendi porra nenhuma. Mas tentei...
Quem manja da parada, procura lá "o fracassado" ou " o merda fracassado" que já deve ter umas postagens iradas. Agora, meus fãs - voyers de merda - não ficarão sabendo só dos "fracassos memoráveis" aqui por esse blog. Acompanharão minhas cagadas na entrada e na saída de qualquer lugar que eu for, todo dia, toda hora.
Isso se eu realmente consegui me cadastrar naquela porcaria gringa.
Acho que esse é o link, vê lá:
http://twitter.com/fracassado
E os cadastrados recebem as mensagens do seu ídolo( limitadas em até 140 toques) nos seus celulares, orkut, e-mail, etc, em tempo real. Acho que é mais ou menos disso que se trata.
O jogador de basquete shaquile O'Neal posta mensagens o tempo todo. Britney Spears tem milhares de seguidores. O Dalai-Lama pode ser lido no twitter e o brasileiro Paulo Coelho também. O Barack Obama tem 409 mil seguidores. O humorista brasileiro Marcelo Tas ( do CQC) fechou um acordo milionário com a Telefonica para meter o nome da operadora no meio das suas pensatas e informes sobre sua rotina diária, que é seguida por dezenas de milhares de pessoas.
Ao seguir a vida das pessoas famosas, as pessoas normais sentem fazer parte da vida e do cotidiano delas.
Como o Merda Fracassado é um cara antenado e não quer perder o bonde da história ( porra, esse termo acho que já caiu em desuso...) tentei me cadastrar no twitter também. Não tenho certeza se consegui concluir o cadastro. Tá tudo em inglês e eu não entendi porra nenhuma. Mas tentei...
Quem manja da parada, procura lá "o fracassado" ou " o merda fracassado" que já deve ter umas postagens iradas. Agora, meus fãs - voyers de merda - não ficarão sabendo só dos "fracassos memoráveis" aqui por esse blog. Acompanharão minhas cagadas na entrada e na saída de qualquer lugar que eu for, todo dia, toda hora.
Isso se eu realmente consegui me cadastrar naquela porcaria gringa.
Acho que esse é o link, vê lá:
http://twitter.com/fracassado
domingo, 22 de março de 2009
NADADOR FRACASSADO
Em janeiro de 2005 descobri que a minha saúde estava indo de mal a pior. Colesterol, hérnia-de-disco, varizes, etc. Estava com 126 quilos. Decidi parar de fumar ( maconha e Derby), de beber ( Itaipava e Conhaque Presidente) e de comer porcarias gordurosas ( que prefiro nem mencionar). Hábito que, até então, era diário.
Entrei na natação ( no Central Sport Club, clube de Barra do Piraí, minha cidade).
Como eu não sabia nadar nada [ trocadilho involuntário] , e eu nunca tinha entrado numa piscina que não desse pé para mim, o professor me colocou na piscina infantil com a pranchinha. Fiquei três meses lá treinando arduamente. Entre todos os alunos da piscina infantil, o professor dizia que eu era o segundo melhor. Isso me empolgou. Só um aluno mais velho, o Helinho, de oito anos, que era mais rápido do que eu.
Quando me disseram que no dia 27 de janeiro de 2005 haveria um campeonato de crown na piscina infantil, valendo medalha, eu treinei mais ainda pra detonar com o Helinho. Eu tinha que ganhar aquela medalha.
Ganhei!
O Helinho ficou dizendo que eu tinha ganhado no crown porque o meu braço era maior do que o dele, já que eu tinha 30 anos. Cara perdedor! Não soube lidar com a derrota!
Após esses meses de intenso treino de natação, perdi, pra minha felicidade, 10 quilos. Estava só com 116. Me senti um atleta. Um Ironman.
Eu queria mais desafios.
Apesar de eu nunca ter nadado no mar, corajosamente me inscrevi no 14º Campeonato Brasileiro de Triatlo Sprint do Rio de Janeiro. Triatlo Sprint é uma modalidade light de triatlo que consiste em cumprir 750 metros de natação, 20 km de bicicleta e, por final, 5 km de corrida. A competição estava marcada para o dia 15 de maio de 2005.
Era abril. Voltei pra piscininha e fiquei treinando todo dia, durante um mês.
Chegado o dia, parti pro Rio de Janeiro e, apresentando-me como competidor, fiquei na praia ( natação: a primeira etapa da competição) ao lado dos outros atletas esperando o tiro de largada. Meu amigo, o Renato, tinha ido comigo e estranhamente desconfiando do meu potencial como atleta, me perguntou:
- Cara! Tô preocupado. Tem certeza de que você vai conseguir nadar no mar? È totalmente diferente de piscina, velho.
Expliquei pra ele que eu era mestre no crown, que já tinha até ganhado medalha na modalidade, e que já tinha vencido até o Helinho, um nadador sinistro de bom. Tirei de cabeça o pensamento negativo do Renato. Ele, então, passou a me dar força e incentivo.
De repente o auto-falante na praia anuncia:
[ AOS SEUS LUGARES!]
Encho o peito de coragem e determinação e fico aguardando o tiro de largada. Olho para os lados e vejo mais de cem competidores. Não me intimido. Olho pra trás e, com o punho cerrado, demonstrando auto-confiança, aceno para o meu amigo Renato.
[ PUM!]
Saio correndo em direção ao mar, ao lado dos outros competidores e, após os pulos largos sobre as primeiras ondas, mergulho.
Dou a primeira potente braçada crown, seguida da segunda e terceira e quarta. Respiro pra esquerda. Mais quatro braçadas e respiro pra direita ( como o professor tinha ensinado). Assim vou, braçada a braçada, sentindo a água deslizar veloz sobre o meu peito. Como eu não estava acostumado a nadar no mar, a água salgada começou a turvar a minha vista. Eu já não conseguia enxergar nada na minha frente nem aos lados. Mas não me preocupei, já que sentia que devia estar entre os primeiros devido a minha velocidade. Calculei que já devia estar a uns 300 metros da praia.
Depois de cinco minutos de vigorosas braçadas ( duvido que o Helinho agüentaria essa!), já um pouco cansado, mas percebendo já estar em alto mar, decido levantar a cabeça pra localizar minha privilegiada posição entre os outros competidores.
Quando abaixei as pernas pra tirar a cabeça pra fora d’água, meu joelho bateu com força numa coisa áspera. Doeu pra caralho. Estranhei. Esfreguei bem os olhos que estavam ardendo pra caramba pela a água salgada e, pra minha surpresa, percebi que devia estar num banco de areia em pleno alto mar.
Fiquei de pé. Meus olhos começaram a voltar a enxergar.
Quando olhei pra trás, tomei um susto. Eu ainda estava na beira da praia. A cinco metros da areia. Olhei pra frente e vi ao longe os outros competidores já há uns 500 metros pra dentro do mar. Devia ser uma corrente marítima que me troxe de volta, pensei. Decidi superar essa adversidade e mergulhar novamente pra recuperar minha posição, mas o joelho estava sangrando pra cacete e começou a latejar.
Coisas da vida, vou desistir. Dei azar mesmo. Uma desgraçada corrente marítima me pegou desprevenido, pensava enquanto retornava pra areia e pra faixa de largada.
Quando levantei a cabeça e olhei pro pessoal que estava na torcida, percebi que todos, todos, sem exceção, estavam gargalhando. A multidão inteira, centenas de pessoas gargalhavam e olhavam apontando pra mim.
Fui em direção ao Renato, que estava encolhido no chão tendo espasmos de gargalhadas frenéticas. Esperei ele terminar de rir ( que demorou um pouquinho) e perguntei, rindo também, porque todos estavam agindo daquela maneira engraçada. Perguntei o que havia acontecido, qual era a graça, curiosíssimo.
Ele recuperou o fôlego e me disse:
- Cara! A coisa mais estranha que eu já vi na minha vida! Quando deram o tiro de largada, você saiu em direção ao mar todo obesão e desengonçado. Deu um mergulho estalado e sumiu. De repente, ali na beirinha da água, aparece um murundu molhado. Não distingui o que era. Quando olhei bem, vi que eram as suas costas gordas boiando. De repente apareceu descoordenadamente um braço pra cima e depois outro. Tipo de quem pede ajuda quando está se afogando. Os salva-vidas acharam que era afogamento e foram em sua direção. Eu os impedi e falei pra eles esperarem, que não era afogamento não, e que eles iam ver uma coisa muito engraçada. Aí aparece de dentro da água sua cabeça toda molhada buscando ar. Um coisa estranhíssima. Você não saía do lugar. Ficava só aquela ilha morena e brilhosa tremendo no mesmo lugar. Parecia um dorso de um peixe-boi. Costas gordas boiando, um braço pra cima e depois outro, cabeção molhado procurando ar e sem sair do lugar. Isso durou uns cinco minutos. Todo mundo na praia começou a gargalhar quando percebeu a bizarrice. O pessoal até esqueceu dos outros competidores, que já estavam longe, pra ficar zoando de você. Até os juízes quase morreram de tanto rir. Os salva-vidas deitaram na areia e chegaram a ficar com falta de ar devido ao acesso de risos. Centenas de pessoas aqui na praia se escangalharam. A praia inteira se divertiu às suas custas. Muito engraçado! Engraçado pra caralho cara! Cê fez isso de propósito, não foi não? Só pode ser! Ninguém nada tão mal assim cara!
Respondi rindo sem graça que sim. Vesti o bermudão por cima da sunga e saí da praia, deixando os risos pra trás, em direção à minha casa.
Só pode ter sido praga do Helinho, aquele desgraçado.
( assim que eu me via nadando)
( pras pessoas que me viam nadando, eu era assim)
Entrei na natação ( no Central Sport Club, clube de Barra do Piraí, minha cidade).
Como eu não sabia nadar nada [ trocadilho involuntário] , e eu nunca tinha entrado numa piscina que não desse pé para mim, o professor me colocou na piscina infantil com a pranchinha. Fiquei três meses lá treinando arduamente. Entre todos os alunos da piscina infantil, o professor dizia que eu era o segundo melhor. Isso me empolgou. Só um aluno mais velho, o Helinho, de oito anos, que era mais rápido do que eu.
Quando me disseram que no dia 27 de janeiro de 2005 haveria um campeonato de crown na piscina infantil, valendo medalha, eu treinei mais ainda pra detonar com o Helinho. Eu tinha que ganhar aquela medalha.
Ganhei!
O Helinho ficou dizendo que eu tinha ganhado no crown porque o meu braço era maior do que o dele, já que eu tinha 30 anos. Cara perdedor! Não soube lidar com a derrota!
Após esses meses de intenso treino de natação, perdi, pra minha felicidade, 10 quilos. Estava só com 116. Me senti um atleta. Um Ironman.
Eu queria mais desafios.
Apesar de eu nunca ter nadado no mar, corajosamente me inscrevi no 14º Campeonato Brasileiro de Triatlo Sprint do Rio de Janeiro. Triatlo Sprint é uma modalidade light de triatlo que consiste em cumprir 750 metros de natação, 20 km de bicicleta e, por final, 5 km de corrida. A competição estava marcada para o dia 15 de maio de 2005.
Era abril. Voltei pra piscininha e fiquei treinando todo dia, durante um mês.
Chegado o dia, parti pro Rio de Janeiro e, apresentando-me como competidor, fiquei na praia ( natação: a primeira etapa da competição) ao lado dos outros atletas esperando o tiro de largada. Meu amigo, o Renato, tinha ido comigo e estranhamente desconfiando do meu potencial como atleta, me perguntou:
- Cara! Tô preocupado. Tem certeza de que você vai conseguir nadar no mar? È totalmente diferente de piscina, velho.
Expliquei pra ele que eu era mestre no crown, que já tinha até ganhado medalha na modalidade, e que já tinha vencido até o Helinho, um nadador sinistro de bom. Tirei de cabeça o pensamento negativo do Renato. Ele, então, passou a me dar força e incentivo.
De repente o auto-falante na praia anuncia:
[ AOS SEUS LUGARES!]
Encho o peito de coragem e determinação e fico aguardando o tiro de largada. Olho para os lados e vejo mais de cem competidores. Não me intimido. Olho pra trás e, com o punho cerrado, demonstrando auto-confiança, aceno para o meu amigo Renato.
[ PUM!]
Saio correndo em direção ao mar, ao lado dos outros competidores e, após os pulos largos sobre as primeiras ondas, mergulho.
Dou a primeira potente braçada crown, seguida da segunda e terceira e quarta. Respiro pra esquerda. Mais quatro braçadas e respiro pra direita ( como o professor tinha ensinado). Assim vou, braçada a braçada, sentindo a água deslizar veloz sobre o meu peito. Como eu não estava acostumado a nadar no mar, a água salgada começou a turvar a minha vista. Eu já não conseguia enxergar nada na minha frente nem aos lados. Mas não me preocupei, já que sentia que devia estar entre os primeiros devido a minha velocidade. Calculei que já devia estar a uns 300 metros da praia.
Depois de cinco minutos de vigorosas braçadas ( duvido que o Helinho agüentaria essa!), já um pouco cansado, mas percebendo já estar em alto mar, decido levantar a cabeça pra localizar minha privilegiada posição entre os outros competidores.
Quando abaixei as pernas pra tirar a cabeça pra fora d’água, meu joelho bateu com força numa coisa áspera. Doeu pra caralho. Estranhei. Esfreguei bem os olhos que estavam ardendo pra caramba pela a água salgada e, pra minha surpresa, percebi que devia estar num banco de areia em pleno alto mar.
Fiquei de pé. Meus olhos começaram a voltar a enxergar.
Quando olhei pra trás, tomei um susto. Eu ainda estava na beira da praia. A cinco metros da areia. Olhei pra frente e vi ao longe os outros competidores já há uns 500 metros pra dentro do mar. Devia ser uma corrente marítima que me troxe de volta, pensei. Decidi superar essa adversidade e mergulhar novamente pra recuperar minha posição, mas o joelho estava sangrando pra cacete e começou a latejar.
Coisas da vida, vou desistir. Dei azar mesmo. Uma desgraçada corrente marítima me pegou desprevenido, pensava enquanto retornava pra areia e pra faixa de largada.
Quando levantei a cabeça e olhei pro pessoal que estava na torcida, percebi que todos, todos, sem exceção, estavam gargalhando. A multidão inteira, centenas de pessoas gargalhavam e olhavam apontando pra mim.
Fui em direção ao Renato, que estava encolhido no chão tendo espasmos de gargalhadas frenéticas. Esperei ele terminar de rir ( que demorou um pouquinho) e perguntei, rindo também, porque todos estavam agindo daquela maneira engraçada. Perguntei o que havia acontecido, qual era a graça, curiosíssimo.
Ele recuperou o fôlego e me disse:
- Cara! A coisa mais estranha que eu já vi na minha vida! Quando deram o tiro de largada, você saiu em direção ao mar todo obesão e desengonçado. Deu um mergulho estalado e sumiu. De repente, ali na beirinha da água, aparece um murundu molhado. Não distingui o que era. Quando olhei bem, vi que eram as suas costas gordas boiando. De repente apareceu descoordenadamente um braço pra cima e depois outro. Tipo de quem pede ajuda quando está se afogando. Os salva-vidas acharam que era afogamento e foram em sua direção. Eu os impedi e falei pra eles esperarem, que não era afogamento não, e que eles iam ver uma coisa muito engraçada. Aí aparece de dentro da água sua cabeça toda molhada buscando ar. Um coisa estranhíssima. Você não saía do lugar. Ficava só aquela ilha morena e brilhosa tremendo no mesmo lugar. Parecia um dorso de um peixe-boi. Costas gordas boiando, um braço pra cima e depois outro, cabeção molhado procurando ar e sem sair do lugar. Isso durou uns cinco minutos. Todo mundo na praia começou a gargalhar quando percebeu a bizarrice. O pessoal até esqueceu dos outros competidores, que já estavam longe, pra ficar zoando de você. Até os juízes quase morreram de tanto rir. Os salva-vidas deitaram na areia e chegaram a ficar com falta de ar devido ao acesso de risos. Centenas de pessoas aqui na praia se escangalharam. A praia inteira se divertiu às suas custas. Muito engraçado! Engraçado pra caralho cara! Cê fez isso de propósito, não foi não? Só pode ser! Ninguém nada tão mal assim cara!
Respondi rindo sem graça que sim. Vesti o bermudão por cima da sunga e saí da praia, deixando os risos pra trás, em direção à minha casa.
Só pode ter sido praga do Helinho, aquele desgraçado.
( assim que eu me via nadando)
( pras pessoas que me viam nadando, eu era assim)
terça-feira, 17 de março de 2009
FÃ FRACASSADO
- Então gatinha? Vamos rapar fora daqui? Tomar um gelos lá no meu apê?
Eu, na mesa ao lado, ouvi aquilo e fiquei doido. Meu primo não ficou nem meia hora trocando idéia com aquela gata linda e já conseguiu arrastar ela pro cafofo dele. O cara é foda! Passa o rodo geral.
Esse meu primo mais velho era uma espécie de herói pra mim. Eu era o seu fã. Um novo tipo de super-herói que tem o super-poder de ter assunto pra tudo quanto é papo. As muié ficam doida. O cara domina geral. Papo-cabeça de barzinho de faculdade. Assunto de sala de espera de teatro. Idéias que rolam em lounges de boates. Aquele plá sobre rock. Filosofia de botequim. O cara nunca ficava sem assunto. Só que o meu herói era bem seleto. Só usava seus super-poderes com as gatinhas. Desde que interessasse ele, ele proseava sobre qualquer assunto. E encantava as minas. Ele me contou: já comeu mais de quatrocentas e vinte mulheres usando essa sua versatilidade, que eu chamo de “super-poderes”. Meu herói. Ele não era boa-pinta como os outros heróis, mas, pelo menos, não usava cueca por cima da calça. Era feio mas era cabeça-feita pra caralho. Seu poder de sedução estava somente no seu grau de conhecimento sobre qualquer assunto que lhe perguntassem. Qualquer um mesmo. Causava admiração nas mulheres e inveja nos homens. Conquistou e comeu todas as gatinhas falando sobre o que quer que elas puxassem de assunto. Ele até fez uma bizarra lista dos temas que as gatas puxavam e me mostrou. Taqui comigo, olha só::
Antídodo caseiro pra picada d jararaca, Animes japoneses, filme O fabuloso Destino de Amelie Poulain, Xangai e Elomar, , mistura de Menthos com Coca-cola, Corinthians na segunda divisão, presença de discos voadores na Serra da Beleza em Conservatória, o pai castrador e católico do Nietzsche , beijação em 2002 na micareta de Salvador, Watchmen, Almir Guineto, caneta mont blanc, bichices do Zé Celso, preço das coisas na rua Vinte e Cinco de Março, maldições sobre a banda Gangrena Gasosa, coluna da Joyce Pascovich, teorias dos Formalistas Russos, humilhações aos artistas pelo Pânico na TV, O Segredo de Rondha Byrne, xilogravuras do J. Borges, a nova visão holística , mecânica de Opala, turma do Bolinha e da Luluzinha, a viola de Helena Meirelles, revista Klaxon dos modernistas, Bob Cuspe, exame de papanicolau, teorias sobre pós-modernidade do Derrida, prática do le parkour no centro de São Paulo, livro O Elogio da Punheta de Sebastião Nunes, bala & bola na rave de Porto Seguro, capítulo “No caminho de Swann” do livro do Proust, G. Magazine do Vampeta, Cartas do Yage de Burroughs & Ginsberg, Kid Bengala, desenho animado A Dama e o Vagabundo, óculos de sol da Dolce & Gabbana, O Erotismo do Bataille, retorno do Salgadinho ao Katinguelê, versos do Ceguinho da Paraíba, revolução de 64, pedido público de demissão Jorge Cajurú, As Três Irmãs do Tchechov, práticas de Do-in, campanha do Atlético Paranaense, Lobão e a treta com as gravadoras, Batalha Naval, Controle de Qualidades de Alimentos, análise Lacaniana, filme Os Sonhadores do Bertolucci, show do Ventania em São Tomé das Letras, álbum do Amar é, home theater da Pioneer , “Uma manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa deu por si na cama transformado...”, receita de bala de coco com cogumelo alucinógeno, Luxação Recidivante do Ombro, Os Replicantes e o punk gaúcho, novo notebook da Apple, namorado brasileiro do Freddie Mercury, fanzines dos anos oitenta, Charles Mingus, O ser e o Nada do Sartre, cenoura no cu do Mário Gomes, gibi do Riquinho, café orgânico, peças do Augusto Boal, Kraftwerk, campeonato de Muay-tay, games violentos em lan houses, O retrato de Dorian Gray, espetinho de polenta frita no “Tudo no Espeto” de Juiz de Fora, Capítulo XIV dos Lusíadas, Glen Benton e as igrejas incendiadas, Tratado sobre a Tolerância do Voltaire, filmes com a Ângela Summers, última corrida do Nagel Mansel, As alegres comadres de Windsor de Sheakespeare, juventude trotskista, pompoarismo, o Ivan Lins perdendo a oportunidade de gravar no Thriller do Michael Jackson, Jornal Notícia Populares, hai-kais do Bashô , reveillon em Copacabana, artigo anti-Obama do Olavo de Carvalho, gibi do Fráuzio, churros, Nelson Rodrigues em Suzana Flag, vinil raro do Noite Illustrada, vídeo de snuff movie no You Tube, esteróides e anabolizantes, mentiras do Carlos Imperial, charuto Corona, primeiro cd do Raça Negra, violência nas escolas, Freud & Cocaína, radicalismo vegetariano, revolta da chibata, melhores filmes de comédia romântica, diálogos de Molly Bloom, implante dentário, Damião Experiença, injeção de sangue contaminado com HIV na Oktoberfest de 1998, Emmanuel Kant, depilação à cera, filmografia do Godard, a covardia que o Jaguar fez com a carreira do Wilson Simonal, luta do Minotauro contra Fedor na Rússia, Karametade sem o Vavá, Gil e a Mãe Menininha do Gantois, como filiar-se ao Greenpeace, coprofagia, imigração ilegal nos Estados Unidos, biografia do Henry Miller, Zé Dirceu e o mensalão, o racional e o místico em Witggenstein, MC Marcinho & Bob Rum, Chaplin versus Keaton, mensagem subliminar na publicidade, livro A Vênus de Cetim de Wilma Azevedo, Camelo & Amarante e Lennon & Mccartney, escultura em areia, Sonetos y Poemas de Gilka Machado, chocolates da Copenhagen, última cena do Rock O Lutador III, priapismo, idiotices do José Ramos Tinhorão, a polêmica do livro Deus um Delírio, qualidade dos móveis Rudnick, boca da Cléo Pires, o vômito no filme O exorcista, Nike Shox 12 molas, autores famosos psicografados pelos Gasparetto, Marvel versus D.C., Plínio Salgado e o Integralismo, livros grátis para baixar na Internet, samba do Agepê, preço do aborto numa clínica clandestina, livros esgotados do Pitigrilli, música da Marinês e sua Gente, livro do Fritz the Cat, museu Câmara Cascudo, Marcelo Madureira dizendo que o Glauber Rocha é uma merda, gloss e pancake, livros do Valêncio Xavier, levante de 1935, casaco Adidas vintage, Seu Jorge ex-mendigo, Jornal Dobrabil, incenso de patchulli, guerrilha do Araguaya, Prozac, jantar Judaico, Seassure versus Chomsky, teorias da conspiração, referendo sobre o porte de armas, manga e hentai , Revista Placar de fevereiro de 1984, podolatria do Henfil, preço da remoção de uma tatuagem, garoto chupando o peitinho da Xuxa no filme Amor Estranho Amor, Fellini oito e meio, como ganhar dinheiro com um blog, dvd novo do Bruno e Marrone, show da banda punk Exploited, programa Expedições com a Paula Saldanha, Detentos do Rap, a morte do Leon Eliachar, faca dentro do boneco do Fofão, técnicas de Rapel, autobiografia do Grouxo Marx, Alexandre Pires na fase do bigodinho, O dicionário do Diabo de Ambrose Bierce, benefícios da acupuntura, quadrinhos do Moebius, preço de roupinhas para bebê, cerveja Malt 90, Calabar do Ruy Gerra e do Chico Buarque, bolsa da Victor Hugo, sexo anal no banco de trás de um fusquinha, loja na galeria do rock do Fabão do Olho Seco, Apocalipse capítulo XIII, Noel sem Vadico, sexo tântrico, Enciclopédia Barsa Eletrônica, Bispo Edir Macedo contra a Rede Globo, vinil do 4 Skins, DJ Cidinho Cambalhota, A Vaca de Nariz Sutil do Campos de Carvalho, golpe de 64, o grotesco de Shuehiro Maruo em quadrinhos, nudismo nas praias de Balneário Camburiú, dvd do Altamiro Carrilho, avanços da Biogenética, Richard Strauss ,Zacharias dos Trapalhões, suicídio da Virgínia Woolf, cd da banda oi Central do Brasil, o “juntos chegaremos lá” do Afif Domingos, poesia russa moderna, quadros do Pollock, desvio de grana no Chatô do Guilherme Fontes, Jeans Levi’s 501, filmes do Ed Wood, Coldplay, massagem erótica, Paulo Francis no Manhattan Conection, perfume Kaiak na Natura, Mãe de Gorki, tretas nos bailes funks cariocas, versos para Marília de Dirceu, esculturas em barro do Mestre Vitalino, Chacal e o CEP 20.000, Filme Anti-herói americano, pataquadas do Arnaldo Jabor, Tartufo de Moliere, Millôr artista plástico, Kill Bill doTarantino, gravação de PeloTelefone por Donga, amigdalite e a vida de Camille Claudel.
Viu só? Que quantidade de assunto doideira que ele já falou pra comer as mina? Ele falou que tem muito mais. A maioria ele esqueceu de anotar.
Só que...
...Decepção!
Eu descobri que os seus super-poderes não eram do jeito que eu pensava que fossem. Ele mesmo me contou. Disse pra mim que, na verdade, esse conhecimento todo tinha uma fonte. Me contou como é que agia: quando estava, por exemplo, em um barzinho, conversando com uma gatinha, e ela puxasse um assunto qualquer que ele não conhecesse, ele interrompia a gata no meio da conversa, pegava seu celular GSM 2,5G , fingia que tava mandando uma mensagem, acessava o browser WAP e conectando-se à Internet, colocava, pela conexão wireless, o endereço do Google e a página abria.
Meu primo me disse:
- É moleza brotherzinho. Cê pode fazer também. Esse página do Google que surge no celular chama-se Google Number Search. Aí você utiliza o teclado numérico do celular para “digitar” o termo que deve ser buscado. O tal assunto que a gatinha puxou. Cê utiliza sempre o dígito 0 para os espaços e 1 para os parênteses. Véio, depois que o Google resolveu lançar esse buscador nos celulares, possibilitou que mais de 4 milhões de resultados pudessem ser acessados usando só os teclados numéricos. Tudo numa fração de segundos. De onde você estiver. E eu me dei bem, né? Veio, com esse “ Google de celular”, a gente pode fazer tudo o que o Google faz em um computador, e talvez um pouco mais. E as gatas adoram carinhas inteligentes. Né não?
Puto, passei a chamar meu primo de “Gloogleman”. Isso mesmo: o homem-google. Gloogleman , meu ex-herói.
Além do mais,os super-poderes só duravam enquanto durasse a bateria do celular.
Eu, na mesa ao lado, ouvi aquilo e fiquei doido. Meu primo não ficou nem meia hora trocando idéia com aquela gata linda e já conseguiu arrastar ela pro cafofo dele. O cara é foda! Passa o rodo geral.
Esse meu primo mais velho era uma espécie de herói pra mim. Eu era o seu fã. Um novo tipo de super-herói que tem o super-poder de ter assunto pra tudo quanto é papo. As muié ficam doida. O cara domina geral. Papo-cabeça de barzinho de faculdade. Assunto de sala de espera de teatro. Idéias que rolam em lounges de boates. Aquele plá sobre rock. Filosofia de botequim. O cara nunca ficava sem assunto. Só que o meu herói era bem seleto. Só usava seus super-poderes com as gatinhas. Desde que interessasse ele, ele proseava sobre qualquer assunto. E encantava as minas. Ele me contou: já comeu mais de quatrocentas e vinte mulheres usando essa sua versatilidade, que eu chamo de “super-poderes”. Meu herói. Ele não era boa-pinta como os outros heróis, mas, pelo menos, não usava cueca por cima da calça. Era feio mas era cabeça-feita pra caralho. Seu poder de sedução estava somente no seu grau de conhecimento sobre qualquer assunto que lhe perguntassem. Qualquer um mesmo. Causava admiração nas mulheres e inveja nos homens. Conquistou e comeu todas as gatinhas falando sobre o que quer que elas puxassem de assunto. Ele até fez uma bizarra lista dos temas que as gatas puxavam e me mostrou. Taqui comigo, olha só::
Antídodo caseiro pra picada d jararaca, Animes japoneses, filme O fabuloso Destino de Amelie Poulain, Xangai e Elomar, , mistura de Menthos com Coca-cola, Corinthians na segunda divisão, presença de discos voadores na Serra da Beleza em Conservatória, o pai castrador e católico do Nietzsche , beijação em 2002 na micareta de Salvador, Watchmen, Almir Guineto, caneta mont blanc, bichices do Zé Celso, preço das coisas na rua Vinte e Cinco de Março, maldições sobre a banda Gangrena Gasosa, coluna da Joyce Pascovich, teorias dos Formalistas Russos, humilhações aos artistas pelo Pânico na TV, O Segredo de Rondha Byrne, xilogravuras do J. Borges, a nova visão holística , mecânica de Opala, turma do Bolinha e da Luluzinha, a viola de Helena Meirelles, revista Klaxon dos modernistas, Bob Cuspe, exame de papanicolau, teorias sobre pós-modernidade do Derrida, prática do le parkour no centro de São Paulo, livro O Elogio da Punheta de Sebastião Nunes, bala & bola na rave de Porto Seguro, capítulo “No caminho de Swann” do livro do Proust, G. Magazine do Vampeta, Cartas do Yage de Burroughs & Ginsberg, Kid Bengala, desenho animado A Dama e o Vagabundo, óculos de sol da Dolce & Gabbana, O Erotismo do Bataille, retorno do Salgadinho ao Katinguelê, versos do Ceguinho da Paraíba, revolução de 64, pedido público de demissão Jorge Cajurú, As Três Irmãs do Tchechov, práticas de Do-in, campanha do Atlético Paranaense, Lobão e a treta com as gravadoras, Batalha Naval, Controle de Qualidades de Alimentos, análise Lacaniana, filme Os Sonhadores do Bertolucci, show do Ventania em São Tomé das Letras, álbum do Amar é, home theater da Pioneer , “Uma manhã, ao despertar de sonhos inquietantes, Gregor Samsa deu por si na cama transformado...”, receita de bala de coco com cogumelo alucinógeno, Luxação Recidivante do Ombro, Os Replicantes e o punk gaúcho, novo notebook da Apple, namorado brasileiro do Freddie Mercury, fanzines dos anos oitenta, Charles Mingus, O ser e o Nada do Sartre, cenoura no cu do Mário Gomes, gibi do Riquinho, café orgânico, peças do Augusto Boal, Kraftwerk, campeonato de Muay-tay, games violentos em lan houses, O retrato de Dorian Gray, espetinho de polenta frita no “Tudo no Espeto” de Juiz de Fora, Capítulo XIV dos Lusíadas, Glen Benton e as igrejas incendiadas, Tratado sobre a Tolerância do Voltaire, filmes com a Ângela Summers, última corrida do Nagel Mansel, As alegres comadres de Windsor de Sheakespeare, juventude trotskista, pompoarismo, o Ivan Lins perdendo a oportunidade de gravar no Thriller do Michael Jackson, Jornal Notícia Populares, hai-kais do Bashô , reveillon em Copacabana, artigo anti-Obama do Olavo de Carvalho, gibi do Fráuzio, churros, Nelson Rodrigues em Suzana Flag, vinil raro do Noite Illustrada, vídeo de snuff movie no You Tube, esteróides e anabolizantes, mentiras do Carlos Imperial, charuto Corona, primeiro cd do Raça Negra, violência nas escolas, Freud & Cocaína, radicalismo vegetariano, revolta da chibata, melhores filmes de comédia romântica, diálogos de Molly Bloom, implante dentário, Damião Experiença, injeção de sangue contaminado com HIV na Oktoberfest de 1998, Emmanuel Kant, depilação à cera, filmografia do Godard, a covardia que o Jaguar fez com a carreira do Wilson Simonal, luta do Minotauro contra Fedor na Rússia, Karametade sem o Vavá, Gil e a Mãe Menininha do Gantois, como filiar-se ao Greenpeace, coprofagia, imigração ilegal nos Estados Unidos, biografia do Henry Miller, Zé Dirceu e o mensalão, o racional e o místico em Witggenstein, MC Marcinho & Bob Rum, Chaplin versus Keaton, mensagem subliminar na publicidade, livro A Vênus de Cetim de Wilma Azevedo, Camelo & Amarante e Lennon & Mccartney, escultura em areia, Sonetos y Poemas de Gilka Machado, chocolates da Copenhagen, última cena do Rock O Lutador III, priapismo, idiotices do José Ramos Tinhorão, a polêmica do livro Deus um Delírio, qualidade dos móveis Rudnick, boca da Cléo Pires, o vômito no filme O exorcista, Nike Shox 12 molas, autores famosos psicografados pelos Gasparetto, Marvel versus D.C., Plínio Salgado e o Integralismo, livros grátis para baixar na Internet, samba do Agepê, preço do aborto numa clínica clandestina, livros esgotados do Pitigrilli, música da Marinês e sua Gente, livro do Fritz the Cat, museu Câmara Cascudo, Marcelo Madureira dizendo que o Glauber Rocha é uma merda, gloss e pancake, livros do Valêncio Xavier, levante de 1935, casaco Adidas vintage, Seu Jorge ex-mendigo, Jornal Dobrabil, incenso de patchulli, guerrilha do Araguaya, Prozac, jantar Judaico, Seassure versus Chomsky, teorias da conspiração, referendo sobre o porte de armas, manga e hentai , Revista Placar de fevereiro de 1984, podolatria do Henfil, preço da remoção de uma tatuagem, garoto chupando o peitinho da Xuxa no filme Amor Estranho Amor, Fellini oito e meio, como ganhar dinheiro com um blog, dvd novo do Bruno e Marrone, show da banda punk Exploited, programa Expedições com a Paula Saldanha, Detentos do Rap, a morte do Leon Eliachar, faca dentro do boneco do Fofão, técnicas de Rapel, autobiografia do Grouxo Marx, Alexandre Pires na fase do bigodinho, O dicionário do Diabo de Ambrose Bierce, benefícios da acupuntura, quadrinhos do Moebius, preço de roupinhas para bebê, cerveja Malt 90, Calabar do Ruy Gerra e do Chico Buarque, bolsa da Victor Hugo, sexo anal no banco de trás de um fusquinha, loja na galeria do rock do Fabão do Olho Seco, Apocalipse capítulo XIII, Noel sem Vadico, sexo tântrico, Enciclopédia Barsa Eletrônica, Bispo Edir Macedo contra a Rede Globo, vinil do 4 Skins, DJ Cidinho Cambalhota, A Vaca de Nariz Sutil do Campos de Carvalho, golpe de 64, o grotesco de Shuehiro Maruo em quadrinhos, nudismo nas praias de Balneário Camburiú, dvd do Altamiro Carrilho, avanços da Biogenética, Richard Strauss ,Zacharias dos Trapalhões, suicídio da Virgínia Woolf, cd da banda oi Central do Brasil, o “juntos chegaremos lá” do Afif Domingos, poesia russa moderna, quadros do Pollock, desvio de grana no Chatô do Guilherme Fontes, Jeans Levi’s 501, filmes do Ed Wood, Coldplay, massagem erótica, Paulo Francis no Manhattan Conection, perfume Kaiak na Natura, Mãe de Gorki, tretas nos bailes funks cariocas, versos para Marília de Dirceu, esculturas em barro do Mestre Vitalino, Chacal e o CEP 20.000, Filme Anti-herói americano, pataquadas do Arnaldo Jabor, Tartufo de Moliere, Millôr artista plástico, Kill Bill doTarantino, gravação de PeloTelefone por Donga, amigdalite e a vida de Camille Claudel.
Viu só? Que quantidade de assunto doideira que ele já falou pra comer as mina? Ele falou que tem muito mais. A maioria ele esqueceu de anotar.
Só que...
...Decepção!
Eu descobri que os seus super-poderes não eram do jeito que eu pensava que fossem. Ele mesmo me contou. Disse pra mim que, na verdade, esse conhecimento todo tinha uma fonte. Me contou como é que agia: quando estava, por exemplo, em um barzinho, conversando com uma gatinha, e ela puxasse um assunto qualquer que ele não conhecesse, ele interrompia a gata no meio da conversa, pegava seu celular GSM 2,5G , fingia que tava mandando uma mensagem, acessava o browser WAP e conectando-se à Internet, colocava, pela conexão wireless, o endereço do Google e a página abria.
Meu primo me disse:
- É moleza brotherzinho. Cê pode fazer também. Esse página do Google que surge no celular chama-se Google Number Search. Aí você utiliza o teclado numérico do celular para “digitar” o termo que deve ser buscado. O tal assunto que a gatinha puxou. Cê utiliza sempre o dígito 0 para os espaços e 1 para os parênteses. Véio, depois que o Google resolveu lançar esse buscador nos celulares, possibilitou que mais de 4 milhões de resultados pudessem ser acessados usando só os teclados numéricos. Tudo numa fração de segundos. De onde você estiver. E eu me dei bem, né? Veio, com esse “ Google de celular”, a gente pode fazer tudo o que o Google faz em um computador, e talvez um pouco mais. E as gatas adoram carinhas inteligentes. Né não?
Puto, passei a chamar meu primo de “Gloogleman”. Isso mesmo: o homem-google. Gloogleman , meu ex-herói.
Além do mais,os super-poderes só duravam enquanto durasse a bateria do celular.
sexta-feira, 13 de março de 2009
ROTEIRISTA DE FILME AUTOBIOGRÁFICO FRACASSADO
Hoje é sexta-feira treze de março de 2009. Sorte minha que eu não sou supersticioso: nasci numa sexta-feira treze, às treze horas e treze minutos.
[ minha certidão comprovando a data e a hora azarada, pros incrédulos confirmarem]
Segue abaixo o roteiro que eu fiz para um filme autobiográfico, desde o nascimento até os meus 33 anos ( idade em que eu tinha certeza que ia morrer), mas...
*****************
Voz em off dizendo:
-Acho que até antes de eu nascer, o azar já me perseguia.
Cena - Anos 70, casal se paquerando em uma discoteque, visual típico da época.
Aproximam-se, o homem diz:
- Que sorte te encontrar aqui, sempre te vejo na escola...
Beijam-se.
Cena de começo de namoro.
A mulher diz que está grávida.
- Pó, que azar! Diz o homem.
Continua voz em off: ( enquanto passa imagens de bebê no útero)
Mas nunca acreditei nesse lance de azar ou sorte, nunca fui superticioso.
Homem em carro desesperado. Trânsito engarrafado. Mulher resfolegando. Pneu fura em plena favela.
( outras situações azaradas, provocando suspense...)
Corta para cena em hospital. Mulher em trabalho de parto. A câmera focaliza um calendário eletrônico, daqueles antigos, marcando sexta-feira 13, 13:00.1975.
A mulher em desespero, resfolegando, gritando de dor. O médico, com dificuldade para retirar a criança comenta:
- Você não está com muita sorte minha filha, a cabeça dessa criança é enorme!
Até que , demonstrando alívio, consegue tirar a criança e ela chora.
Câmera focaliza novamente o relógio: sexta-feira 13, 13:13. 1975.
Voz em off:
Nasci, na sexta-feira 13 às 13 horas e treze minutos.
Cena de ambulatório infantil, criança na incubadora, família inteira em volta preocupada. Comenta o médico:
- É desidratação.
Chama o pai num canto e comenta:
- Se tiver muita sorte ele sobreviverá, mas talvez com seqüelas.
Cenas de evangélicos e critãos, rezadeiras e até de pais de santo rezando em volta da incubadora da criança.
Câmera mostra incubadora com pé de coelho e ferradura.
Comenta um senhor , pro desagrado de todos diante de sua inconveniência, em voz alta:
- Que moleque feio einh! Se tiver sorte, quando crescer vai poder trabalhar em trem fantasma.
Voz em off:
Sobrevivi,e desde criança mantive uma convicção: não acreditava e odiava essa historia de sorte e azar.
Corta pra cenas de infância. Moleque franzino com óculos fundo-de-garrafa.
Não sendo escolhido no futebol. Tomando porrada de moleques maiores.
Era feio, assumo, mas me orgulhava do cabelo preto, liso, brilhoso. Não cortava de maneira nenhuma.
Cena das menininhas da escola alisando-o e elogiando-o. Os moleques, de longe, com inveja, mas comentam em tom jocoso a aparência ridícula do garoto. Desdenhando de sua aparência.
Cenas mostra todos os garotos imaginando, com cabelos como o dele sendo afagados pelas meninas.
- Pô, o cara tem sorte mesmo, nascer com um cabelo bacana desse.
Até que um dia, Selminha, a mais bonitinha da sala , com a sua cabeça deitada do colo , fazendo-lhe cafuné, grita:
- Lêndea!
Câmera filma de cima . Pega o pátio inteiro da escola. A molecada e a meninada olhando todos ao mesmo tempo pra nós.
- Lêndea! Sua cabeça ta infestada de ovinhos de piolho ! Ai que nojo!!!
Afasta-se chorando, esfregando as mãos, enquanto a molecada vai se aproximando, sacaneando:
- Piolhento ! Piolhento! Piolhento ! Piolhento! Piolhento ! Piolhento!
Cena do menino em casa, a mãe olhando minunciosamente a dando-lhe uma notícia estarrecedora :
- Vai ter que raspar!
Voz em off:
Pesadelo! Minha única virtude era ter os cabelos sedosos e lindos e agora teria que raspar.
Mostra imagem do garoto careca, com óculos fundo-de-garrafa, roupa ridícula, sozinho num canto.
- Não! Não vou raspar de jeito nenhum!
- Não tem jeito meu filho, Não há remédio no mundo que consiga matar todas essas lêndeas. Ta infestado!
O garoto sai correndo e vai pro quarto chorando.
Enquanto isso, em off:
Eu tinha que dar um jeito naquilo. Eu era uma espécie de sansão, sem os meus cabelos eu perderia meu poder de sedução.
Corta pra cena do garoto ouvindo a conversa na sala entre sua mãe e uma amiga.
Diz a mãe:
- Não sei o que eu faço com o meu filho! Tem mais de uma semana que ele não quer ir pra aula e ainda por cima recusa-se a raspar a cabeça.
- Criança é assim mesmo, a gente dá o maior carinho e eles acabam tornando-se uns tremendos mal-criados, diz a amiga.
- Mas menina, mudando de assunto, o que você conta de novo?
- Ah querida, vim aqui só pra te contar uma maravilhosa que eu descobri: sabe aqueles desagradáveis fios brancos que aparecem na nossa cabeça? É balzaquiana, descobri uma tintura pro cabelo ma-ra-vi-lho-sa que encobre todos, Olha aqui, [abaixa a cabeça] consegui achar um perfeitamente da cor original dos meus cabelos. E nem parece que foi pintado! Vende lá da farmácia do seu Alfredo!
- É mesmo menina, seu cabelo tá lindo, igual quando você tinha 10 anos...
Voz em off:
Fiquei maravilhado com a descoberta, havia descoberto a solução para o meu problema. Ia pintar todos os fios meu sedoso cabelo de preto e com isso, as desgraçadas lêndeas também.
Cena do garoto na farmácia escolhendo tinturas e feliz lê numa caixa: “ Para cabelos pretos, macios e sedosos”.
Corta pra cena do garoto , em casa, pintando escondido o cabelo.
- Mãe, olha só, as lêndeas sumiram ! Nem vou precisar de raspar a cabeça!
A mãe examinando, surpresa, e comentando:
- É mesmo meu filho que dádiva! Agora você pode voltar pra escola que já deve estar atrasado na matéria! Vou até lá fora comprar um uniforme novo pra você, novinho, branquinho ! Que maravilha!
Corta pra cena do garoto entrando na escola. Slow motion, cabelão preto voando, reluzente, uniforme engomadinho. Cara de orgulhoso. Todos olhando. Chega para a Selminha que está de costas e , antes que ela diga alguma coisa, exclama:
- Acabaram as lêndeas, podem olhar [ abaixando a cabeça no meio da rodinha de meninas] !
As meninas examinam e com ar de apaixonadas confirmam. Os garotos, de longe, com cara de raivosos ficam resmungando. Selminha ainda diz:
- Seu cabelo parece que ficou mais bonito ainda, e mais macio...
Cena mostra - em slow motion – bem de perto Selminha passando os dedos por entre os seu fios de cabelo. Câmera enquadra de perto a cara de apaixonada de Selminha, a das meninas, a dos garotos e a dele, com cara de orgulhoso. Até que, quando seus dedos terminam de transpassar todo o cabelo, ela olha para as costas da mão assustada e berra;
- O que que é isso ? Esse monte de bolinhas pretas na minha mão?
Voz em off:
O que eu não sabia, ao pintar o cabelo de preto, era que a química da tintura faria com que as lêndeas soltassem-se tão facilmente.
Cena mostra em slow motion o garoto olhando com cara de desespero para os ombros da camisa branquinha, lotados de bolinhas pretas e olhando novamente para o rosto da Selminha, agora com ar apavorado:
- Lêndea preta?
E desmaia.
Os garotos começam a gritar: Aberração ! Lêndea preta! Lêndea preta! Lêndea preta!
*******************************
Corte abrupto para o garoto sentado numa aula de catecismo, aquele tom monocórdido, ele desenhando Jesus enquanto, de repente acorda e ouve a professora dizendo:
- Pois o Nosso senhor Jesus Cristo foi-se aos 33 anos e com isso deixou, através de seus milagres, do que fez e quem foi, vários ensinamentos que mudaram a história da humanidade.
Cena mostra o garoto olhando para o desenho de Jesus no caderno e escreve embaixo do desenho:
Estou com 13 anos e sou um fracasso total. Será que até os 33 anos eu conseguirei fazer alguma coisa que preste?
Cena do garoto andando com o caderno nas mãos, desolado, pela calçada, quando, repentinamente, uma cigana de aparência desleixada, dentes podres, cabelos desgrenhados , toma-lhe a mão direita , à força, ele tentando desvencilhar-se, gritando:
- Larga a minha mão, velha desgraçada ! Não acredito nessas superstições !
Ela, ainda segurando com muita força, consegue virar a palma da mão direita do garoto para cima e ao olhar, faz cara de incrédula, chega o rosto mais perto da palma da mão para conferir e fazendo uma expressão extremamente assustada exclama:
- Menino ! A sua linha da vida é muito curta! Aqui diz que você não vai passar dos 30, deixa eu ver direito
E chega o rosto mais perto da palma da mão do garoto, quase encostando no rosto.
O garoto sacudindo-se com força, tentando tirar a mão, sem sucesso.
- 33 anos ! Aqui diz que você não passa dos 33 anos !
O garoto dá um solavanco e consegue tirar a mão.
- Vai tomar no cu ! Velha desgraçada ! Filha da puta!
E sai aos tropeços, andando rápido.
O menino, ainda andando rápido, olha de soslaio para dentro de um botequim e vê na parede um calendário:
SEXTA-FEIRA, 13 DE MAIO DE 1988.
**********************************************************************
Pulo no tempo
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Cena dele já acima dos 30 anos, barrigudo, barbudo, de cuecas, deitado na cama lendo. O quarto com aparência de sujo. Livros jogados para todo o canto, vinis, cinzeiros sujos. A câmera volta para ele deitado e mostra nas suas mãos o livro Sexus de Henri Miller.
Voz em off narrando o livro:
“ (...) uma vida totalmente nova estendia-se diante de mim, tivesse eu apenas a coragem de tudo arriscar. Na verdade não havia nada a arriscar: eu estava no primeiro degrau da escada, um fracasso em todo sentido da palavra. Estava me aproximando do trigésimo terceiro aniversário, a idade de Cristo crucificado (...)”
Interrompe a leitura no meio. Abaixa o livro no colo. Senta na cama com cara de espanto. Levanta-se da cama rapidamente, abre o guarda roupa, caem vários livros, folhas, gibis, cadernos. Ele começa a olhar a capa dos cadernos desesperado, até que acha o que estava procurando. Folheia com violência e para numa página específica e fica estático olhando.
A câmera mostra o caderno encardido com um desenho de Jesus e um manuscrito embaixo : Estou com 13 anos e sou um fracasso total. Será que até os 33 anos eu conseguirei fazer alguma coisa que preste?
Levanta-se, ainda segurando o caderno, olha para cima , na parede ao alto do seu ombro esquerdo.
A câmera mostra um calendário:
SEXTA-FEIRA, 13 DE JUNHO DE 2008.
Ele olha pro caderno de novo. Sacode a cabeça e de repente lhe vem a lembrança [ mostra a cena, turva em eco] da cigana agarrando-o aos 13 anos:
- 33 anos ! Aqui diz que você não passa dos 33 anos !
Ele grita:
- Porra ! Hoje é o meu aniversário de 33 anos !
Olha no relógio, são 13:00. Fica desnorteado. Sai correndo do quarto, de cueca branca, cabelão, barba grande. Desce as escadas desesperado. Vai em direção à rua. Está chovendo muito. Ele para no meio do asfalto, abre os braços, uma luz forte o clareia todo.
[ minha certidão comprovando a data e a hora azarada, pros incrédulos confirmarem]
Segue abaixo o roteiro que eu fiz para um filme autobiográfico, desde o nascimento até os meus 33 anos ( idade em que eu tinha certeza que ia morrer), mas...
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Voz em off dizendo:
-Acho que até antes de eu nascer, o azar já me perseguia.
Cena - Anos 70, casal se paquerando em uma discoteque, visual típico da época.
Aproximam-se, o homem diz:
- Que sorte te encontrar aqui, sempre te vejo na escola...
Beijam-se.
Cena de começo de namoro.
A mulher diz que está grávida.
- Pó, que azar! Diz o homem.
Continua voz em off: ( enquanto passa imagens de bebê no útero)
Mas nunca acreditei nesse lance de azar ou sorte, nunca fui superticioso.
Homem em carro desesperado. Trânsito engarrafado. Mulher resfolegando. Pneu fura em plena favela.
( outras situações azaradas, provocando suspense...)
Corta para cena em hospital. Mulher em trabalho de parto. A câmera focaliza um calendário eletrônico, daqueles antigos, marcando sexta-feira 13, 13:00.1975.
A mulher em desespero, resfolegando, gritando de dor. O médico, com dificuldade para retirar a criança comenta:
- Você não está com muita sorte minha filha, a cabeça dessa criança é enorme!
Até que , demonstrando alívio, consegue tirar a criança e ela chora.
Câmera focaliza novamente o relógio: sexta-feira 13, 13:13. 1975.
Voz em off:
Nasci, na sexta-feira 13 às 13 horas e treze minutos.
Cena de ambulatório infantil, criança na incubadora, família inteira em volta preocupada. Comenta o médico:
- É desidratação.
Chama o pai num canto e comenta:
- Se tiver muita sorte ele sobreviverá, mas talvez com seqüelas.
Cenas de evangélicos e critãos, rezadeiras e até de pais de santo rezando em volta da incubadora da criança.
Câmera mostra incubadora com pé de coelho e ferradura.
Comenta um senhor , pro desagrado de todos diante de sua inconveniência, em voz alta:
- Que moleque feio einh! Se tiver sorte, quando crescer vai poder trabalhar em trem fantasma.
Voz em off:
Sobrevivi,e desde criança mantive uma convicção: não acreditava e odiava essa historia de sorte e azar.
Corta pra cenas de infância. Moleque franzino com óculos fundo-de-garrafa.
Não sendo escolhido no futebol. Tomando porrada de moleques maiores.
Era feio, assumo, mas me orgulhava do cabelo preto, liso, brilhoso. Não cortava de maneira nenhuma.
Cena das menininhas da escola alisando-o e elogiando-o. Os moleques, de longe, com inveja, mas comentam em tom jocoso a aparência ridícula do garoto. Desdenhando de sua aparência.
Cenas mostra todos os garotos imaginando, com cabelos como o dele sendo afagados pelas meninas.
- Pô, o cara tem sorte mesmo, nascer com um cabelo bacana desse.
Até que um dia, Selminha, a mais bonitinha da sala , com a sua cabeça deitada do colo , fazendo-lhe cafuné, grita:
- Lêndea!
Câmera filma de cima . Pega o pátio inteiro da escola. A molecada e a meninada olhando todos ao mesmo tempo pra nós.
- Lêndea! Sua cabeça ta infestada de ovinhos de piolho ! Ai que nojo!!!
Afasta-se chorando, esfregando as mãos, enquanto a molecada vai se aproximando, sacaneando:
- Piolhento ! Piolhento! Piolhento ! Piolhento! Piolhento ! Piolhento!
Cena do menino em casa, a mãe olhando minunciosamente a dando-lhe uma notícia estarrecedora :
- Vai ter que raspar!
Voz em off:
Pesadelo! Minha única virtude era ter os cabelos sedosos e lindos e agora teria que raspar.
Mostra imagem do garoto careca, com óculos fundo-de-garrafa, roupa ridícula, sozinho num canto.
- Não! Não vou raspar de jeito nenhum!
- Não tem jeito meu filho, Não há remédio no mundo que consiga matar todas essas lêndeas. Ta infestado!
O garoto sai correndo e vai pro quarto chorando.
Enquanto isso, em off:
Eu tinha que dar um jeito naquilo. Eu era uma espécie de sansão, sem os meus cabelos eu perderia meu poder de sedução.
Corta pra cena do garoto ouvindo a conversa na sala entre sua mãe e uma amiga.
Diz a mãe:
- Não sei o que eu faço com o meu filho! Tem mais de uma semana que ele não quer ir pra aula e ainda por cima recusa-se a raspar a cabeça.
- Criança é assim mesmo, a gente dá o maior carinho e eles acabam tornando-se uns tremendos mal-criados, diz a amiga.
- Mas menina, mudando de assunto, o que você conta de novo?
- Ah querida, vim aqui só pra te contar uma maravilhosa que eu descobri: sabe aqueles desagradáveis fios brancos que aparecem na nossa cabeça? É balzaquiana, descobri uma tintura pro cabelo ma-ra-vi-lho-sa que encobre todos, Olha aqui, [abaixa a cabeça] consegui achar um perfeitamente da cor original dos meus cabelos. E nem parece que foi pintado! Vende lá da farmácia do seu Alfredo!
- É mesmo menina, seu cabelo tá lindo, igual quando você tinha 10 anos...
Voz em off:
Fiquei maravilhado com a descoberta, havia descoberto a solução para o meu problema. Ia pintar todos os fios meu sedoso cabelo de preto e com isso, as desgraçadas lêndeas também.
Cena do garoto na farmácia escolhendo tinturas e feliz lê numa caixa: “ Para cabelos pretos, macios e sedosos”.
Corta pra cena do garoto , em casa, pintando escondido o cabelo.
- Mãe, olha só, as lêndeas sumiram ! Nem vou precisar de raspar a cabeça!
A mãe examinando, surpresa, e comentando:
- É mesmo meu filho que dádiva! Agora você pode voltar pra escola que já deve estar atrasado na matéria! Vou até lá fora comprar um uniforme novo pra você, novinho, branquinho ! Que maravilha!
Corta pra cena do garoto entrando na escola. Slow motion, cabelão preto voando, reluzente, uniforme engomadinho. Cara de orgulhoso. Todos olhando. Chega para a Selminha que está de costas e , antes que ela diga alguma coisa, exclama:
- Acabaram as lêndeas, podem olhar [ abaixando a cabeça no meio da rodinha de meninas] !
As meninas examinam e com ar de apaixonadas confirmam. Os garotos, de longe, com cara de raivosos ficam resmungando. Selminha ainda diz:
- Seu cabelo parece que ficou mais bonito ainda, e mais macio...
Cena mostra - em slow motion – bem de perto Selminha passando os dedos por entre os seu fios de cabelo. Câmera enquadra de perto a cara de apaixonada de Selminha, a das meninas, a dos garotos e a dele, com cara de orgulhoso. Até que, quando seus dedos terminam de transpassar todo o cabelo, ela olha para as costas da mão assustada e berra;
- O que que é isso ? Esse monte de bolinhas pretas na minha mão?
Voz em off:
O que eu não sabia, ao pintar o cabelo de preto, era que a química da tintura faria com que as lêndeas soltassem-se tão facilmente.
Cena mostra em slow motion o garoto olhando com cara de desespero para os ombros da camisa branquinha, lotados de bolinhas pretas e olhando novamente para o rosto da Selminha, agora com ar apavorado:
- Lêndea preta?
E desmaia.
Os garotos começam a gritar: Aberração ! Lêndea preta! Lêndea preta! Lêndea preta!
*******************************
Corte abrupto para o garoto sentado numa aula de catecismo, aquele tom monocórdido, ele desenhando Jesus enquanto, de repente acorda e ouve a professora dizendo:
- Pois o Nosso senhor Jesus Cristo foi-se aos 33 anos e com isso deixou, através de seus milagres, do que fez e quem foi, vários ensinamentos que mudaram a história da humanidade.
Cena mostra o garoto olhando para o desenho de Jesus no caderno e escreve embaixo do desenho:
Estou com 13 anos e sou um fracasso total. Será que até os 33 anos eu conseguirei fazer alguma coisa que preste?
Cena do garoto andando com o caderno nas mãos, desolado, pela calçada, quando, repentinamente, uma cigana de aparência desleixada, dentes podres, cabelos desgrenhados , toma-lhe a mão direita , à força, ele tentando desvencilhar-se, gritando:
- Larga a minha mão, velha desgraçada ! Não acredito nessas superstições !
Ela, ainda segurando com muita força, consegue virar a palma da mão direita do garoto para cima e ao olhar, faz cara de incrédula, chega o rosto mais perto da palma da mão para conferir e fazendo uma expressão extremamente assustada exclama:
- Menino ! A sua linha da vida é muito curta! Aqui diz que você não vai passar dos 30, deixa eu ver direito
E chega o rosto mais perto da palma da mão do garoto, quase encostando no rosto.
O garoto sacudindo-se com força, tentando tirar a mão, sem sucesso.
- 33 anos ! Aqui diz que você não passa dos 33 anos !
O garoto dá um solavanco e consegue tirar a mão.
- Vai tomar no cu ! Velha desgraçada ! Filha da puta!
E sai aos tropeços, andando rápido.
O menino, ainda andando rápido, olha de soslaio para dentro de um botequim e vê na parede um calendário:
SEXTA-FEIRA, 13 DE MAIO DE 1988.
**********************************************************************
Pulo no tempo
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Cena dele já acima dos 30 anos, barrigudo, barbudo, de cuecas, deitado na cama lendo. O quarto com aparência de sujo. Livros jogados para todo o canto, vinis, cinzeiros sujos. A câmera volta para ele deitado e mostra nas suas mãos o livro Sexus de Henri Miller.
Voz em off narrando o livro:
“ (...) uma vida totalmente nova estendia-se diante de mim, tivesse eu apenas a coragem de tudo arriscar. Na verdade não havia nada a arriscar: eu estava no primeiro degrau da escada, um fracasso em todo sentido da palavra. Estava me aproximando do trigésimo terceiro aniversário, a idade de Cristo crucificado (...)”
Interrompe a leitura no meio. Abaixa o livro no colo. Senta na cama com cara de espanto. Levanta-se da cama rapidamente, abre o guarda roupa, caem vários livros, folhas, gibis, cadernos. Ele começa a olhar a capa dos cadernos desesperado, até que acha o que estava procurando. Folheia com violência e para numa página específica e fica estático olhando.
A câmera mostra o caderno encardido com um desenho de Jesus e um manuscrito embaixo : Estou com 13 anos e sou um fracasso total. Será que até os 33 anos eu conseguirei fazer alguma coisa que preste?
Levanta-se, ainda segurando o caderno, olha para cima , na parede ao alto do seu ombro esquerdo.
A câmera mostra um calendário:
SEXTA-FEIRA, 13 DE JUNHO DE 2008.
Ele olha pro caderno de novo. Sacode a cabeça e de repente lhe vem a lembrança [ mostra a cena, turva em eco] da cigana agarrando-o aos 13 anos:
- 33 anos ! Aqui diz que você não passa dos 33 anos !
Ele grita:
- Porra ! Hoje é o meu aniversário de 33 anos !
Olha no relógio, são 13:00. Fica desnorteado. Sai correndo do quarto, de cueca branca, cabelão, barba grande. Desce as escadas desesperado. Vai em direção à rua. Está chovendo muito. Ele para no meio do asfalto, abre os braços, uma luz forte o clareia todo.
quarta-feira, 4 de março de 2009
TRABALHADOR CLANDESTINO NOS E.U.A. FRACASSADO
Terminei a faculdade de Letras em 1997, Português e Inglês, a muito custo, trabalhando de metalúrgico numa fábrica de tambores plásticos em Barra do Piraí ( cidade onde ainda moro). Trampando com dor nas costas ( trabalho braçal: ver OPERÁRIO FRACASSADO) durante o dia e estudando a noite. Fui mandado embora e arrumei um trampo numa empreiteira da C.S.N em Volta Redonda ( cidade vizinha a minha). A hérnia atacou novamente. Fui mandado pra rua de novo. Fiz o concurso para professor do Estado e passei. Dava aulas em quase todas as escolas da periferia da minha cidade. Tinha alunos que iam na escola só pra fazer movimento de drogas e ficar zoando a aula. Desrespeitavam, mandavam-me tomar no cu, tacavam bolinha de papel com cuspe na minha cara ( ver PROFESSOR FRACASSADO). Ganhava uma mixaria que não dava nem pra pagar o aluguel direito. Com a Milena dizendo que tava grávida foi que a situação ficou pior ainda. Quase fui em cana duas vezes porque a pensão atrasou. Comecei dar aulas particulares de Inglês. Mesmo assim vivia na pindaíba, morando numa quitinete lá no Atrás do Saco ( quem mora em Barra do Piraí sabe onde é).
Depois que eu separei da Milena, era ligação quase toda semana pra encher o saco: remédio pro Carlinho, roupa, dinheiro pra passeio, pra material escolar. Um inferno.
Quando o Ranieri, um camarada meu, ligou dizendo que tava partindo pros States eu tive novas esperanças. Trampar no exterior, fosse no que fosse, iria ser muito mais vantajoso. Assim que o ele ligou de Branford, dois meses depois, dizendo que tava ganhando mais de dois mil dólares por mês eu tomei a iniciativa. Tirei passaporte. Falsifiquei até contracheque e carteira profissional. Arrisquei. Podia ir até preso por isso, mas tinha que arriscar. Na entrevista do consulado disse pro vice-consul que era professor do Pedro II ( colégio de elite do Rio), em inglês mesmo pra tirar onda, e que iria pro Estado de Connecticut à passeio.
Consegui a tão almejada autorização.Vendi a Variant 68, a minha coleção completa de gibis do Tex e toda a minha discografia de psichobillys raros. Pedi uma grana emprestada pra minha mãe e pro meu irmão.
States, lá vou eu! Gritava enquanto fazia as malas. Não avisei nada pra Milena. Fiquei na surdina. É claro que ela iria botar areia.
Viajei.
O primeiro trampo que o Ranieri me conseguiu foi de garçom num restaurante, em Branford mesmo. Trabalhador clandestino,é claro. O gerente, um texano escroto, todo dia me discriminando, chamava de macaco, de brasileiro sujo, de chicano ( em inglês é claro, porra!). Fiquei de saco cheio das humilhações e pedi conta. Serviço não era difícil de achar, mas só sub-emprego. Sujeitei-me a condições de trabalho humilhantes e degradantes. Limpador de fossa, carregador de caixas, lavei bunda branca de velhos num asilo em Danbury. Na cidade de Hartford trampava de dia numa espécie de IML limpando defunto e à noite numa delegacia fazendo faxina nas celas dos presos. Trampo asqueroso. Rodei quase todo o estado pegando tudo quanto era tipo de serviço e fugindo da Imigração. Passei um ano nesse sufoco. A grana era boa mas os gastos eram altos também. Não consegui fazer nem um pé-de-meia furado ( ver LOSER FRACASSADO – loser fracassado? não é contraditório não, leia que você vai entender).
Comecei a ficar desesperado. A situação tava pior que no Brasil. Pensei em desistir.
Até que, certo dia, eu tava num ônibus indo de Bristol para Branford, lendo o livro Lucia McCartney do Rubem Fonseca, quando, não tendo nada pra fazer na viagem, peguei o conto Zoom e traduzi do português para o inglês. Eu era bom nisso ( não sou mais. Ver TRADUTOR FRACASSADO)
Chegando em Branford tive uma idéia talvez me tirasse da lama: fui na cara-de-pau na redação do Westport News, apresentei-me para o chefe de redação, o George, como jornalista autodidata. Inventei uma mentira de que era brasileiro fazendo uma pesquisa sobre o jornalismo gonzo norte-americano e apresentei o conto do Rubem Fonseca traduzido como se fosse meu, perguntando se os interessaria publicá-lo. O redator leu e adorou-o. Ficou com o texto. Adiantou seiscentos dólares na mão. Seiscentos dólares! Eu precisaria de lavar muita bunda de velho pra conseguir essa grana. Moleza! Fiquei entusiasmadão com a idéia. Liguei para o redator e disse que tinha outros contos e crônicas para enviar. O redator, além de concordar em publicar, deu o endereço de outros jornais para que eu oferecesse meu “excelente trabalho” ( falou isso em inglês, é claro, porra!).
Peguei todos os livros de contos e crônicas de escritores brasileiros que tinha levado pros States e comecei a traduzi-los manhã, tarde e noite. Liguei pra minha mãe e pedi que ela me enviasse, aos poucos, pelo correio, mais alguns livros. Verti para o inglês mais de duzentas crônicas e cento e trinta contos em menos de um mês.
Conversando com um amigo jornalista americano, o Gary, que havia lido todos os “meus” textos, ele me dissera que havia ficado impressionado com a minha “versatilidade de estilos e vozes completamente díspares” ( falou isso em inglês, é claro, porra!). Propôs publicação em livro e me botou em algumas fitas para contato. Eu tava durinho da silva, vivendo de favor na casa do Ranieri. Só traduzindo e traduzindo.
Gary disse que queria ser meu agente literário. Topei. Ficamos fazendo contatos. Rodamos todas as cidades do estado: Bridgeport, Woodbury, New Haven ( onde tem a melhor casa de blues que eu já vi) , Fairfield, Meriden, Middletown, Norwalk, Manchester ( com milhares de cheerleaders maravilhosas ensaiando, espalhadas em grupos pelas esquinas), Southington, Waterbury, Bristol, Danbury, Newtown, Darien, Greenwich, Hartford, Guilford, Middletown, Willimantic, Stamford e em Norwich. Tudo financiado pelo brother ( falo em português, é claro, porra!) Gary, que estava me emprestando essa grana acreditando no meu futuro e talentoso sucesso.
Depois de fazer vários contatos, voltei pra casa e fiquei só traduzindo e traduzindo. Juntando mercadoria para vender pros tais jornais. Organizei de forma que fosse mandar um conto para cada redação de jornal. Manter a periodicidade de um autor por periódico: Carlos Drummond de Andrade para o The Norwalk Citizen-News, Nelson Rodrigues para o The Darien News-Review, Rubem Alves para o Westport News, Rubem Fonseca para o The Connecticut College Voice, Carlos Heitor Cony para o Connecticut Post, Luis Fernando Verissimo para o Hartford Courant, Marcos Rey para o Meriden Record Journal, Clarice Lispector para o Amity Observer, Otto Lara Resende para o The News-Times, Sérgio Sant’Anna para o The Fairfield Citizen-News, Murilo Rubião para o Greenwich Time, Moacyr Scliar para o Guilford Courier, José J. Veiga para o The Wesleyan Argus, Millôr Fernandes para o The New Haven Register, Luiz Vilela para o The Yale Herald, Machado de Assis para o Yale Daily News, Lygia Fagundes Telles para o New London Day, Mário Prata para o Newtown Bee, e Fernando Sabino, que eu achava mais fácil de traduzir para os jornais Norwich Bulletin, Waterbury Republican-American e The Chronicle.
Tudo como se fosse de minha própria autoria, é claro.
Um mês depois,Gary foi lá em casa ( a do Ranieri, é claro, porra!) e pediu-me os textos para que fosse fazer as postagens.
Gary saiu lá de casa com os textos na mão para começar a postá-los. Os correios ( lá não chama-se “correios”, chama-se FedEx ,porra!) estavam fechados.
Greve.
Por dois dias.
Gary voltou lá pra casa e me disse que iria postar em três dias, sem falta.
Rico. Eu gritava: “Rico! Vou ficar rico e famoso!” ( isso eu gritava em português mesmo, é claro, porra!).
Gary me abraçava e gritava também ( quer saber se o Gary gritava que ia ficar rico em português ou inglês? Vai tomar no cu, porra!).
Isso foi no dia 10 de setembro de dois mil e um.
Ps> Não preciso explicar mais nada, né? Além da merda toda que botou areia, devido ao meu fenótipo totalmente árabe, fui deportado em menos de um mês ( nesse entremeio quase morri na mão de yankees xenófobos paranóicos).
Porra, acho que o Bin Laden fez essa porra toda só pra me fuder.
Aê Bin! Se você estiver lendo essa porra agora, se liga na missão: Fuck you!
( em bom português, é claro, porra!)
Depois que eu separei da Milena, era ligação quase toda semana pra encher o saco: remédio pro Carlinho, roupa, dinheiro pra passeio, pra material escolar. Um inferno.
Quando o Ranieri, um camarada meu, ligou dizendo que tava partindo pros States eu tive novas esperanças. Trampar no exterior, fosse no que fosse, iria ser muito mais vantajoso. Assim que o ele ligou de Branford, dois meses depois, dizendo que tava ganhando mais de dois mil dólares por mês eu tomei a iniciativa. Tirei passaporte. Falsifiquei até contracheque e carteira profissional. Arrisquei. Podia ir até preso por isso, mas tinha que arriscar. Na entrevista do consulado disse pro vice-consul que era professor do Pedro II ( colégio de elite do Rio), em inglês mesmo pra tirar onda, e que iria pro Estado de Connecticut à passeio.
Consegui a tão almejada autorização.Vendi a Variant 68, a minha coleção completa de gibis do Tex e toda a minha discografia de psichobillys raros. Pedi uma grana emprestada pra minha mãe e pro meu irmão.
States, lá vou eu! Gritava enquanto fazia as malas. Não avisei nada pra Milena. Fiquei na surdina. É claro que ela iria botar areia.
Viajei.
O primeiro trampo que o Ranieri me conseguiu foi de garçom num restaurante, em Branford mesmo. Trabalhador clandestino,é claro. O gerente, um texano escroto, todo dia me discriminando, chamava de macaco, de brasileiro sujo, de chicano ( em inglês é claro, porra!). Fiquei de saco cheio das humilhações e pedi conta. Serviço não era difícil de achar, mas só sub-emprego. Sujeitei-me a condições de trabalho humilhantes e degradantes. Limpador de fossa, carregador de caixas, lavei bunda branca de velhos num asilo em Danbury. Na cidade de Hartford trampava de dia numa espécie de IML limpando defunto e à noite numa delegacia fazendo faxina nas celas dos presos. Trampo asqueroso. Rodei quase todo o estado pegando tudo quanto era tipo de serviço e fugindo da Imigração. Passei um ano nesse sufoco. A grana era boa mas os gastos eram altos também. Não consegui fazer nem um pé-de-meia furado ( ver LOSER FRACASSADO – loser fracassado? não é contraditório não, leia que você vai entender).
Comecei a ficar desesperado. A situação tava pior que no Brasil. Pensei em desistir.
Até que, certo dia, eu tava num ônibus indo de Bristol para Branford, lendo o livro Lucia McCartney do Rubem Fonseca, quando, não tendo nada pra fazer na viagem, peguei o conto Zoom e traduzi do português para o inglês. Eu era bom nisso ( não sou mais. Ver TRADUTOR FRACASSADO)
Chegando em Branford tive uma idéia talvez me tirasse da lama: fui na cara-de-pau na redação do Westport News, apresentei-me para o chefe de redação, o George, como jornalista autodidata. Inventei uma mentira de que era brasileiro fazendo uma pesquisa sobre o jornalismo gonzo norte-americano e apresentei o conto do Rubem Fonseca traduzido como se fosse meu, perguntando se os interessaria publicá-lo. O redator leu e adorou-o. Ficou com o texto. Adiantou seiscentos dólares na mão. Seiscentos dólares! Eu precisaria de lavar muita bunda de velho pra conseguir essa grana. Moleza! Fiquei entusiasmadão com a idéia. Liguei para o redator e disse que tinha outros contos e crônicas para enviar. O redator, além de concordar em publicar, deu o endereço de outros jornais para que eu oferecesse meu “excelente trabalho” ( falou isso em inglês, é claro, porra!).
Peguei todos os livros de contos e crônicas de escritores brasileiros que tinha levado pros States e comecei a traduzi-los manhã, tarde e noite. Liguei pra minha mãe e pedi que ela me enviasse, aos poucos, pelo correio, mais alguns livros. Verti para o inglês mais de duzentas crônicas e cento e trinta contos em menos de um mês.
Conversando com um amigo jornalista americano, o Gary, que havia lido todos os “meus” textos, ele me dissera que havia ficado impressionado com a minha “versatilidade de estilos e vozes completamente díspares” ( falou isso em inglês, é claro, porra!). Propôs publicação em livro e me botou em algumas fitas para contato. Eu tava durinho da silva, vivendo de favor na casa do Ranieri. Só traduzindo e traduzindo.
Gary disse que queria ser meu agente literário. Topei. Ficamos fazendo contatos. Rodamos todas as cidades do estado: Bridgeport, Woodbury, New Haven ( onde tem a melhor casa de blues que eu já vi) , Fairfield, Meriden, Middletown, Norwalk, Manchester ( com milhares de cheerleaders maravilhosas ensaiando, espalhadas em grupos pelas esquinas), Southington, Waterbury, Bristol, Danbury, Newtown, Darien, Greenwich, Hartford, Guilford, Middletown, Willimantic, Stamford e em Norwich. Tudo financiado pelo brother ( falo em português, é claro, porra!) Gary, que estava me emprestando essa grana acreditando no meu futuro e talentoso sucesso.
Depois de fazer vários contatos, voltei pra casa e fiquei só traduzindo e traduzindo. Juntando mercadoria para vender pros tais jornais. Organizei de forma que fosse mandar um conto para cada redação de jornal. Manter a periodicidade de um autor por periódico: Carlos Drummond de Andrade para o The Norwalk Citizen-News, Nelson Rodrigues para o The Darien News-Review, Rubem Alves para o Westport News, Rubem Fonseca para o The Connecticut College Voice, Carlos Heitor Cony para o Connecticut Post, Luis Fernando Verissimo para o Hartford Courant, Marcos Rey para o Meriden Record Journal, Clarice Lispector para o Amity Observer, Otto Lara Resende para o The News-Times, Sérgio Sant’Anna para o The Fairfield Citizen-News, Murilo Rubião para o Greenwich Time, Moacyr Scliar para o Guilford Courier, José J. Veiga para o The Wesleyan Argus, Millôr Fernandes para o The New Haven Register, Luiz Vilela para o The Yale Herald, Machado de Assis para o Yale Daily News, Lygia Fagundes Telles para o New London Day, Mário Prata para o Newtown Bee, e Fernando Sabino, que eu achava mais fácil de traduzir para os jornais Norwich Bulletin, Waterbury Republican-American e The Chronicle.
Tudo como se fosse de minha própria autoria, é claro.
Um mês depois,Gary foi lá em casa ( a do Ranieri, é claro, porra!) e pediu-me os textos para que fosse fazer as postagens.
Gary saiu lá de casa com os textos na mão para começar a postá-los. Os correios ( lá não chama-se “correios”, chama-se FedEx ,porra!) estavam fechados.
Greve.
Por dois dias.
Gary voltou lá pra casa e me disse que iria postar em três dias, sem falta.
Rico. Eu gritava: “Rico! Vou ficar rico e famoso!” ( isso eu gritava em português mesmo, é claro, porra!).
Gary me abraçava e gritava também ( quer saber se o Gary gritava que ia ficar rico em português ou inglês? Vai tomar no cu, porra!).
Isso foi no dia 10 de setembro de dois mil e um.
Ps> Não preciso explicar mais nada, né? Além da merda toda que botou areia, devido ao meu fenótipo totalmente árabe, fui deportado em menos de um mês ( nesse entremeio quase morri na mão de yankees xenófobos paranóicos).
Porra, acho que o Bin Laden fez essa porra toda só pra me fuder.
Aê Bin! Se você estiver lendo essa porra agora, se liga na missão: Fuck you!
( em bom português, é claro, porra!)
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